Lívia

Eu pedi lagosta. Achei que era propício pra ocasião. Lívia pediu água sem gás. Continuou com o cardápio aberto enquanto me olhava com cara de dúvida. O que você acha? Tem essa massa com nozes que parece ser boa. Ou... Ela prosseguiria em tom monocórdico... Esse peixe com batatas? Peixe com batatas, eu disse. Peixe com batatas? Ela perguntou como se quisesse ganhar tempo. Não respondi.

- Como está a massa?

- Divina.

- Não estou vendo nozes. Esse molho tá me parecendo meio ralo.

- Está uma delícia.

Ela poderia ter dito qualquer coisa. Na verdade, estávamos com imenso problema de comunicação. Eu não queria falar (e nem comer) e ela aparentemente só queria me impressionar com estórias que em nada me impressionavam. Não mexi um músculo da face quando me contou de sua viagem à Bruxelas (ou seria Antuérpia?), e não via a hora daquela lagosta sair da minha frente quando ela retomou o assunto do início do jantar, parece que falava de um tio distante, um tio gordo, milionário – ela enfatizava o acento no “a” – que havia perdido tudo no cassino em Punta. Uma merda de estória.

Lívia ainda escolheria sobremesa e pediria minha indicação de licor. Indicação de licor? Olhei-a por cima do cardápio que ela acabara de me entregar. Claro. Licor. Escolhi qualquer um, caprichando na pronúncia. - O senhor, por favor, traga duas taças desse Nocello.

Abri a porta do carro para que entrasse. Os dois laminados de chocolate que havia pensado em tirar do banco do carona ainda estavam lá, mas daquela vez não me incomodaram. Ela entrou com algum esforço, cuidando para não tropeçar nos saltos altíssimos e controlando a quantidade de perna que deixaria à mostra.

- Nossa, tem tanto tempo que não entro num carro sem banco de couro.

- Você quer que eu ligue o ar?

- Ah! Não, por favor! Desculpe, falei assim, sabe? Por falar. Na verdade, prefiro os bancos assim, de tecido. O couro gruda. Se importa que eu fume?

- Fique à vontade. Me dá um cigarro? Não sabia que fumava.

- Na verdade eu fumo muito pouco, sabe? Só quando fico nervosa.

Neste momento Lívia abriu a janela e respirou, ou fingiu respirar, profundamente, o ar do lado de fora do carro. A cena me passou imagem pasteurizada, ou ensaiada, não sei. Essa coisa de escolher mulher pelo corpo não pode acabar bem. Eu sempre pensava nisso.

- Você está nervosa?, perguntei enquanto tirava o acendedor do console.

- Um pouco, né? Pra mim é tudo muito novo. Não pense que é assim, viu? Um jantarzinho e logo na primeira noite o carinha me leva pro motel.

- Eu não penso nada, imagina. Essas coisas acontecem, né? Mas fique nervosa, não. Nossa conversa foi tão boa... Sabe, se não fosse tão natural eu me incomodaria. Você tá linda, sabia?

Ela estava linda demais. Esse era o problema dela. Mas era difícil que não estivesse. Salto altíssimo e vestido preto, justo, marcando seu corpo que já me deixava cheio de tesão há dois ou três meses.

O bom do motel é que tudo é feito para queimar etapas. A cama fica embaixo da televisão, os controles ao alcance de um toque, camisinhas na cabeceira. Por instantes lembrei do futebol no dia seguinte. Um mero lapso. Ela já estava nua.

- Quer maconha? –perguntou.

- Maconha?

Ela riu riso sofisticado e respondeu no meu ouvido, enquanto tirava o vestido, mantendo o salto e a bunda na altura do meu rosto, apreciada por todos os ângulos possíveis em razão da profusão de espelhos daquela suíte.

- Não vai dizer que não fuma, Miguel.

- Fumo, claro, na verdade só fiquei surpreso. Mas deixa eu dar um teco. Vou pegar uma cerveja, você quer?

- Deixa que eu pego.

E lá foi ela na direção do frigobar, balançando toda pra andar, nua em pêlo, em seu corpo trabalhado em incontáveis sessões de pilates, ou yoga, ou academia, foda-se.

Fumamos e bebemos e acho que a mistura me embrulhou o estômago. Lívia queria conversar. Justificou-se dizendo que ficava sem graça por me dar no primeiro encontro e que não era normal ter relutado tanto para aceitar meu convite e ir assim, de repente, pra cama daquele jeito. Repetia que eu era uma graça, um cara interessante e que gostava de literatura. Acho lindo alguém que goste de literatura, sabe? Só havia falado dos livros do Chico Buarque, e mesmo assim porque o assunto MPB tinha se esgotado. Achei pitoresco.

Lívia fumou outro baseado e tomou mais duas latas de cerveja. Falava sobre seu ex-namorado quando finalmente espichou o corpo pra trás sentindo minha mão dentro dela. Um único gemido, em sustenido. Funcionou como senha. Classificaria como esquisito.

Livrou-se dos saltos de uma só vez e abocanhou meu pau me fazendo sentir todos os dentes. Senti-me desconfortável e pensei novamente no futebol. O certo é que os espelhos me ajudaram demais e com bom jogo de cintura consegui me livrar daquela sessão de tortura e girar seu corpo fazendo com que a colocasse embaixo de minhas pernas.

A primeira estocada entrou inteira e pude sentir o quão molhada estava aquela buceta. Meu pau entrava inteiro e ela começava a grunhir sons desconexos. Chamou-me de vampiro e evidentemente me preocupei com a ereção.

- Vai, meu vampiro! Mete até o talo!

Intui que se mudasse de posição ela talvez pudesse parar com aquilo. Coloquei-a por cima, sentido sua bunda bater com violência em minha barriga. Ela fodia como uma macaca.

- Vai, meu vampirão, não pára.

Merda! Pensei de novo na porra do futebol e na razão de estar sentindo aquele enjôo todo. Quando voltei a olhar o espelho senti meu pau amolecendo. Que foi, vampiro? Não tá gostando?

- Você pode parar com essa porra de vampiro?

- O quê quê tem de errado?

- Não tem nada de errado, mas você pode parar com isso?

Peguei-a pela cintura e a pus de quatro. Pensei na Fabiana, que me fodia escutando Stones, gozei em poucos segundos e sem que ela tivesse dito mais qualquer coisa. Fui me limpar com vontade de golfar a cerveja e a maconha. Tinha futebol pela manhã e trabalho acumulado. Uma dor forte apareceu nas costas quando a temperatura do corpo caiu. Merda, eu pensei, essa porra de coluna ainda vai me foder.

Pra minha sorte ela já estava vestida e com evidente cara de arrependida. Assistia a um programa qualquer na televisão.

Achei prudente não perguntar se aceitaria o cafezinho que esses motéis dão de cortesia.

Bom, refleti, lá se vai mais uma.