FRESTAS DAS PALAVRAS

Gosto de escrever. Em tantos momentos até acho que escrevo razoavelmente bem. Noutros fico achando que me embaralho com o tempo dos verbos, com a redundância dos adjetivos, exagero nos sinônimos e tantas vezes escorrego nos pronomes.

Mas no todo, acabo me contentando com o resultado da gramática. Jamais impecável, mas aceitável, sem morder demasiadamente nossa língua. Procuro que meus textos tenham começo, meio e fim, como ensina a técnica de redação. Tento reforçar os argumentos, de forma que minhas opiniões e conceitos sejam convincentes, reafirmando fatos e atos com proposital renitência de adjetivos ou meros sinônimos.

Como minha linha de redação tem uma forte tendência poética, acabo me utilizando, comumentemente, de metáforas, mesmo procurando me policiar para que não sejam usadas exageradamente. Dessa tendência poética, acabo usufruído da facilidade de cria imagens, sempre que estou relatando algo, diferente do que faço agora, que apenas me explico.

Procuro ser claro e fiel no que exponho. Tento seguir um caminho regular, de forma a levar quem me lê, para o mais completo entendimento da mensagem que estou transmitindo. Esmero-me na busca de expressões adequadas para facilitação da interpretação, dando, contudo, ao direito de uma certa dose de requinte, salpicando uma e outra palavra elegante.

Ocorre, porém, que as palavras têm frestas, por onde passam luz ou escuridão; harmonia ou desavenças. Por onde passam rios mansos que descem os montes suavemente, ou ondas revoltas de um mar soprado por ventos teimosos forçados pelas tempestades (cá estou eu me utilizando das metáforas....).

E na medida em que as palavras se acumulam, formando frases, as frestas também se somam e vão formando brechas, nos parágrafos vão se fazendo grotas, ficando o texto a mercê das interpretações mais diversas. Verdade. As palavras têm frestas, os versos, as frases, têm brechas e a imaginação tem asas. As vontades têm tendências, os hábitos formam cicatrizes e as intenções normalmente são pré-concebidas.

Assim é que tudo que escrevo, as interpretações podem e serão diversas, porque as palavras têm frestas, por onde vagam as tantas impressões.


Eacoelho
Enviado por Eacoelho em 06/08/2011
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