O NATAL DOS PASSARINHOS
O NATAL DOS PASSARINHOS - Maria Teoro Ângelo
Piscamos os olhos e dezembro chegou. Chegou cheio dos ícones de fim de ano,
de Natal, de verão, de férias, de contrastes. As vitrines exibem seus
produtos em forma de presente, o vermelho é a cor do momento e o comércio se
abastece mais do desejo de comprar do que das vendas realmente
concretizadas. Estamos no clima. No clima de ainda fazer algo que ficou
faltando, de programar umas férias merecidas e observar o abismo das
diferenças sociais tão mais evidentes nesta época.
Outro dia vi a notícia de uma árvore de Natal que era enfeitada com cartões
constando o nome de crianças que ganhariam presentes. O comércio tem de
inventar, mas repete a apologia aos mais afortunados: Eu vou ganhar e você
não. As calçadas das cidades grandes abrigam em escala crescente, além dos
pedestres, os pedintes com crianças no colo aproveitando o sentimento de
culpa de quem gastou muito e que , com a esmola, pensa se redimir.
As confraternizações entre colegas de trabalho fecham os restaurantes e todo
mundo ingere milhares de calorias sem se esquecer de deixar bem visível na
mesa as latinhas de refrigerante diet. Aí vemos que a maneira de segurar os
talheres ou de mastigar estraga a roupa de grife da mocinha bonita. O garfo
é espetado em posição vertical e seguro com a mão bem fechada como quem
enterra a espada no peito do inimigo desprotegido e caído no solo. Uma cesta
básica, um presentinho barato e vamos todos organizando nosso crédito diante
de Deus. Um pensamento de bondade, um oferecimento de perdão e as melhores
intenções nesses dias que prenunciam o ano que virá.
O ano passou depressa, a vida passa depressa e tudo voa. Voa o tempo, voam
muitas esperanças, voam as oportunidades que não soubemos aproveitar. Voam
pássaros nas mangueiras aproveitando a safra generosa. Árvores carregadas de
jacas, de lichias, Tempo dos abacaxis mais doces e dos pêssegos
pingo-de-mel. Mesas fartas, desperdício ao lado da fome e da penúria. Tempos
perigosos , assaltos e roubos como a forma equivocada de repartir melhor o
pão. Tempo de reflexões, de avaliações, de mudanças.
Tempo rico para olhar o mundo e ficar na dúvida se gostou ou não dos galhos
secos pintados de branco, com dezenas de pássaros de enfeite feitos de
acordo com a imaginação de quem os produziu. Impossível nomeá-los com cabeça
de bem-te-vi cauda de penas longas para dar maior efeito.
Tempo de aparências, de muita cor, de muito exagero no que é perfeitamente
dispensável. Tempo de alegrias fabricadas enquanto parecem ficar em segundo
plano o sentido do Natal, do pensamento cristão, a fraternidade, as coisas
mais sinceras e humanas e os pássaros de verdade tendo mais garantia de que
haverá no futuro árvores e frutos. E que os homens vivam em paz!
Dezembro de 2006