Crônica 1

Consumi todo o oxigênio daquela tarde e toda a tristeza daqueles dias. Estava com a casa vazia, a qual exalava um cheiro envelhecido com os papéis de parede virando retalhos que se repuxam e se empurram na companhia da parede. Não estava tranqüila, desenhei pequenos cubos na beirada do jornal enquanto o lia, o que demonstrava a inquietude e a preocupação. A noite havia me avisado dos temores e por isso estava preparada.

O sol nasceu claro aquele dia, jogava seus raios feito lanças e desconsiderava qualquer tipo de comoção, estava bravo e prometeu-me, com um olhar, que me incomodaria o dia todo. Soube na hora que já conhecia este sol, era o mesmo que acordou no dia em que fiz meu último aniversário; e tratando de incômodo não pude deixar de lembrar do bolo de creme Assis que minha tia preparou para meu dia de festa. Nem de longe esse era meu bolo preferido, na verdade não gostava muito de bolos. Por isso quis esquecer o assunto e me concentrei na paisagem.

Naquela manhã entendi o aviso do sol, me dizia para voltar e proclamava os meus atos de derrota sem qualquer pudor. Brilhava o mais alto possível, forte, corajoso e desprovido de pena por aqueles que gostam de viver no escuro. Eu não me dou bem com a escuridão, mas tive que aprender a me posicionar nela, tarefa difícil. Queria no momento combater o sol, ele embaralhava meus sentidos e embravecia minha mente, não sei ao certo o porquê, mas ele não gostava de mim.

Sentei-me na mureta da varanda e a grama molhada tocava as pontas de meus pés, no início repudiei aquela sensação e cheiro de terra úmida, talvez em decorrência dos dias que me conscientizei plantada feito mandioca no solo; Um pouco depois resolvi sentar no jardim onde a grama circundava meu corpo pálido e naquele momento senti poder, como se a terra fosse parte e propriedade minha, e não deixava de ser. Estive confusa e até armei um choro descontrolado, mas me contive.

Por mais que o sol me aqueça insistentemente, a angústia não deixa de aparecer. Na verdade ela já é ponto concreto da minha existência.

Mayara Cristina Pereira,

25/abril/2011

LuaNegra
Enviado por LuaNegra em 28/08/2011
Código do texto: T3187930
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