PLANETA DOS MACACOS
Quando algo parecia difícil de ser encontrado, minha avó costumava dizer: “É como procurar agulha num palheiro!” Agulha ainda pode se ver por aí, mas palheiro onde se esconda... Não havia colchão de mola, dormindo-se em coisa semelhante a sacola de pão – bitelona –, toda de pano e recheada com de palhas de milho rasgadas, naturalmente para melhor acomodar corpos adormecidos. Daí, muita gente padecer de desvios na coluna (entre outros), uma vez que de madrugada a palha se juntava, formando colos no colchão, tipo quebra-molas ao contrário.
Não é novidade pra ninguém: 99% do que se lê nestas crônicas são potocas; enchimento de colchão! Palha estéril. E só por conta da camaradagem dos passageiros da Kombi (meus 13 leitores), isto ainda vai adiante. Não raro, porém, o quase desprezível 1% faltante para a merda derramar na borda do vaso, tem me custado dissabores. Copiei de certo artigo científico – falando de DNA (aquele trenzinho que faz cada um de nós cópia fiel de nossos pais) –, que entre humanos e macacos a diferença não passa também do fatídico, ou salvífico, um por cento. Trem bão, pra mim. Tomou, bargado? Quem mandou confiar na VEJA! Os sábios da revista me deixaram na mão de calango.
Certo senhor com pinta de aposentado – portanto, sem nenhuma pressa pra nada – me pegou pra Cristo! Após ler o ‘absurdo’ num jornalzinho bom-despachense, indagou munido de toda sagacidade: – Você acompanha novela, na TV? Sabichão, respondi que tinha coisas mais importantes a fazer. Aí, ele entrou de sola: – Deveria! Quando passar a reprise, assista aquela onde um macaco pintor, chamado Chico (originalíssimo: macaco por nome Chico!) contracena com a atriz Flávia Alessandra: uma deusa loura em corpo e alma de mulher! E o velhote assanhado me esculhambou, desafiando: – Depois me fale se esta babaquice de 1% de diferença entre humanos e macacos não passa de cascata, invencionice do cinema! Tudo doideira de cientista que passa o dia enfiado no laboratório, e chegando em casa tardão da noite confunde a esposa com a macaca Chita!
Viajante das nuvens, passei a reparar nos primatas, digo, chimpanzés: pouco ou dificilmente andam sobre duas pernas, e ainda assim apoiados nas costas das mãos; onde, aliás, o polegar não é virado como o nosso; também já perdemos o rabo; porém no corpo, temos o mesmo número de ossos... Em compensação, no lugar de guinchos, articulamos palavras, quais “eu amo você”... chegando às abstrações: ou como tirar algo de onde não esteja.
Um por cento de diferença entre humanos e macacos pode parecer pouco para alguns, mas é essencial. Senão, como explicar que um bicho mal-planejado para a vida tenha dominado o planeta? Algo mais aconteceu, em determinado instante da viagem evolutiva. A tartaruguinha, mal saída do ovo, sem que ninguém lhe ensine o caminho chega ao mar. O potrinho, recém parido, dá pinotes no pasto. Enquanto filhote homano nasce frágil, meio cego, incapaz de procurar comida, defender-se dos predadores ainda depois de um ano de vida; fala mais tarde; escreve passado os cinco... Rabiscar crônicas, como da presente feita, somente sexagenário: quando lhe sirvam de desculpas para as mancadas e pirraças da vida.
– O Dilermando já escreveu coisa melhor! Ouvi de alguém, não me consternando. Tudo bem: tou fazendo uma reforma no barraco onde moro, daí dividir o tempo entre escrevinhações e assistência aos operários. Como inda agorinha, o marceneiro – maior prego no sapato – me perguntou exatamente por eles: "com que eu vou pregar o engradamento do telhado?" Pouca coisa é pior do que prego no sapato... algo tão antigo quanto colchão com palha de milho... Minha avó nunca admitiria, porém os macacos vão dominar o Planeta: falo por mim!