AS SUPERSTIÇÕES

“Yo non credo en brujas, pero que las hay, las hay.” Esta é uma frase de Cervantes em “Dom Quixote”. Esta frase, o povo a traduziu para “eu não creio em bruxarias, porém que existem, existem”.

As superstições, as crendices, abusões, existem em todas as regiões, todos os países, todos os continentes, desde tempos remotos. O nosso imenso Luiz da Câmara Cascudo, em seu excelente Dicionário do Folclore Brasileiro, dá uma perfeita definição sobre as superstições: “Resultam essencialmente dos vestígios de cultos desaparecidos ou da deturpação ou acomodação religiosa contemporânea, condicionados à mentalidade popular.” Mais adiante diz: “O Visconde de Santo Tirso: Era supersticioso Napoleão, e era supersticioso Bismark. É livre de toda superstição qualquer jumento, o que prova que a liberdade de espírito não é incompatível com o comprimento das orelhas.” Prosseguem as suas válidas considerações a respeito do assunto, que não dá para transcrever integralmente para não alongar muito este texto.

Conta-se, também, que os antigos reis e imperadores eram supersticiosos. Também Mussolini e Hitler o eram, e muito. Mozart e Bach igualmente o foram. Muitos deles baseavam suas decisões na astrologia ou nos adivinhos e nos tidos como sábios no remoto passado.

Nos poucos dicionários que possuo, inclusive no Aurélio, o que, para mim, melhor define o que seja superstição é o Houais: “1 – crença ou noção sem base na razão ou no conhecimento, que leva a criar falsas obrigações, a temer coisas inócuas, a depositar confiança em coisas absurdas, sem nenhuma relação racional entre os fatos e as supostas causas a eles associadas, crendice, misticismos (p.ex. vários hotéis nos EUA não possuem 13º and.).

Já encontrei muita gente afirmando que não crê em superstição nenhuma; não sei, tenho cá minhas dúvidas, e são tantas... Não vou negar: embora não queira acreditar, remanescem algumas da minha infância, que foi um tempo de muito misticismo; a população era em sua grande maioria católica, mas, nesse particular, muitas pessoas não obedeciam aos princípios da religião, embora alguns autores digam que muitas crendices falsas tenham nela fundamento.

Quando menino, era muito nervoso, saindo aos meus pais, mais à minha mãe, que rezava pela manhã, à tarde e à noite, quando, quase sempre, nos convocava. Minhas noites sempre foram insones; acordava frequentemente no meio da noite ou alta madrugada, e ficava de olhos abertos e ouvidos atentos a qualquer som. A Catedral de Santa Luzia, em Mossoró, naquele tempo era coberta com telhas. Era o esconderijo de milhares de morcegos e talvez dezenas de corujas, assim como o velho prédio da maçonaria (com frente para a Rua 30 de Setembro e fundos para a Rua Pe. João Urbano (onde eu morava). Nele existiam dois grandes quintais, um de cada lado, em cada um dos quais se erguiam dois imensos pés de tamarindo. Às vezes, alta noite, uma dessas corujas voava sobre minha rua e dava um pio rascante e assustador que me arrepiava todo. Ainda hoje recordo e tenho medo desses gritos terríveis apavorando a minha noite, que o povo chamava de “rasga-mortalha”. Tinha horror ao som da matraca nas semanas santas e do badalo de finados.

Se houvesse uma escada armada numa calçada, havendo espaço para circundá-la eu o faço; se não, não tenho medo de passar por baixo. Assim também, se um gato preto cruzar o meu caminho, não me assusto. Mas, se à noite, um cachorro uivava ou uivar parecendo um choro triste, ah, esse uivo me apavora.

São dezenas, talvez centenas, os tipos de superstição, muitas de origem em religiões africanas ou orientais. Existem, ainda, muitas crendices praticadas nas noites das fogueiras de São João, principalmente nas de Santo Antônio, tido como o santo casamenteiro e, também, que ajuda a encontrar coisas perdidas. Eu mesmo, em certas ocasiões em que não consigo encontrar algum objeto perdido, cansado de procurá-lo vasculhando todos os lugares, recorro a Santo Antônio, e daí a alguns momentos, coincidência ou não, o acho.

Para falar sobre todo o tipo de superstições teria ainda muito o que dizer, mas vou parando por aqui, recomendando a leitura das obras de Câmara Cascudo, o maior folclorista deste nosso Brasil.

Obery Rodrigues
Enviado por Obery Rodrigues em 01/09/2011
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