CANTINHO DO CORAÇÃO
Ariovaldo Jardim & Fátima Irene
Por que guardo tantas coisas se muitas delas eu nem sei se vou usar?!
Dizem que cancerianos são assim mesmo...apegados ao passado, com mania de guardar tudo que foi importante, até o bilhete da primeira viagem de trem.
Tenho um cantinho que abriga desde as minhas preciosas lembranças até meus cacarecos. Na verdade é um relicário do qual não quero me desfazer.
Fotografias, antiguidades, livros, discos, documentos de meus antepassados, cartas antigas ... meu cantinho anda atulhado! Sempre penso que um dia meus filhos terão a santa paciência de tomar nas mãos os meus velhos pertences, juntarão as peças do que foi a minha vida e terão uma linda história para contar para meus netos e bisnetos: uma história bem mais bonita do que a que eu mesmo contei a eles ao longo dos anos. Se pudesse, eu guardaria até meu travesseiro, companheiro e confidente de tantas noites, bem ou mal dormidas, testemunha silenciosa de tantas reflexões.
Já cheguei a pensar que talvez seja mania e que seria bem melhor eu me desfazer de tudo. Afinal, acho que devemos chegar na "estação de desembarque" levando a mochila bem leve. Seria também um treino de desapego, um saber deixar para trás aquilo que já teve serventia mas que agora já cumpriu sua função.
E, pensando nesse cantinho de pertences pessoais, percebo que está em minhas mãos conservá-lo, organizá-lo ou dar fim nele. Só depende do meu querer.
 
Mas e o cantinho do coração? Aquele que não podemos dar fim porque está dentro de nós e nos seguirá para onde quer que formos?
Esse cantinho é intangível e é o que mais precisa da nossa atenção.
Não pode ficar sem ventilação, não pode ficar sem luz, não pode ficar sem limpeza, porque do contrário, se tornará pesado de magoazinhas que não soubemos perdoar, de vaidades que permitimos que ficassem espaçosas, de fraquezas que ainda não conseguimos transformar em virtudes, de orgulhos tolos que deixamos sobrepujar a nossa capacidade de sentir amor, ternura  e benevolência.
 
Pensando bem, até que foi bom eu vir no meu cantinho de cacarecos hoje, pois cheguei à conclusão de que não é com ele que eu tenho que me preocupar. 
O que ele contém é tão transitório como a minha própria existência.
Minha atenção agora está no cantinho do coração.
Pretendo desentulhá-lo de tudo que o obscurece e que o deixa pesado. 
Quero deixá-lo levezinho e amoroso, levando apenas o essencial para garantir uma jornada suave ... aqui e nos outros patamares da minha eternidade.
 
 
13.09.2011
DESCALVADO - SP
 
 
 
Fátima Irene Pinto e Ariovaldo Jardim
Enviado por Fátima Irene Pinto em 17/09/2011
Reeditado em 29/11/2011
Código do texto: T3225439
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.