A teia do boato

À guisa de crónica, fingindo estar a escrever para quem me (não) lê, que os de boa audição me escutam, recordo por vezes certas coisas que, com muita mágoa reconheço pecado e da “mea culpa” me penitencio, que indulto não peço.

Acodem-me à memória certas injustiças feitas, umas com maior razão que outras, que indignam muitos – os que não estão por dentro do que as motivou e ousam pronunciar-se, sem conhecer a realidade dos factos, posicionando-se sempre do lado de onde pensam poder tirar maior proveito movidos pelo interesse e pelo habitué da escova e graxa, mas também pela (má) influência de terceiros que seguramente só conseguem viver alimentando-se da intriga e alimentando-a com o seu próprio veneno de língua viperina e suja; e os que, não conhecendo esses reais factos, se calam, cobardemente, sem emitirem qualquer juízo de valor, mesmo que seja o mero argumento jurídico “in dúbio pró réu”, com medo da retaliação desses outros tão hábeis na condução de conflitos, quase contribuindo para a ajuda do esticar da corda que contém o laço, à volta do pescoço pronta a estrangular o nó de Adão do desgraçado que teve a desdita de se aproximar do fruto proibido.

E à memória me assaltam, também, certas difamações caluniosas que, dia a dia, são o objectivo daqueles que delas se servem para vingar na vida, fazendo do atropelo do seu semelhante o seu “modus vivendi” para vencer, que de outro modo não sabem. Falta-lhes o saber ser com honestidade e verdade, valor que deveria ser herdado do berço que não tiveram à nascença.

Uns, com os seus gritos furibundos e na posse de (duvidosos) factores de opiniões e crenças, vertem o fel do boato que aguça o gume da maldade com vista a tornar-se o mais poderoso elemento do progresso humano. As suas paixões, poderosas, facilmente se tornam colectivas, e alteram, mais das vezes, a justeza das opiniões, impedindo de ver as coisas como elas são na realidade e de compreender a sua génese. Vestem-se de finas roupagens, imiscuem-se com o boato, que corrói, constroem dele uma (falsa) realidade palpável de factores que intimidam, dissuasores e que oprimem.

Outros, por preguiça mental, inércia, ou medo de retaliações, não cuidam saber da realidade dos factos, o que tem como principal inconveniente a conivência, tácita, da proliferação da injustiça, pois que, das opiniões baseadas em explicações erróneas, e distorcidas, admitindo-as como definitivas, não se atrevem a procurar outras. Ou seja, negam-se, à partida, a procurar a verdadeira verdade admitindo, como certas, as premissas falaciosas que lhes contam nas costas dos injustiçados. Tanto mais gravosos quando estes têm cargos de chefia e poderes de decisão.

E depois ainda há os restantes que se escondem cobardemente, por detrás da sombra que disfarça o medo e furta a coragem de vir à liça defender o justo. Porquê? Simplesmente porque lhes interessa ter um reino de medo, de calúnia e boato… simplesmente porque lhes interessa ter o rastilho que propaga o fogo e faz detonar a bomba… simplesmente porque também engordam do veneno que lhes corre nas veias… simplesmente porque se defendem a verdade, ficam rapidamente sem assunto para alimentar a intriga. E os boatos crescem de tal ordem que acaba em verdade o que na realidade é mentira.

Mas pior que todos estes, são aqueles que com as suas palavrinhas de “putas mansas” inebriam, com o boato e a mentira, quem tem o poder da decisão e que, levados no canto da sereia, se deixam influenciar e decidem mal. Junta-se o fel ao veneno e transborda a taça. Coitados destes! São fracos chefes!

Se aos primeiros lhes falta a dignidade para se saberem guindar na vida pelo seu valor e, cobardemente, ferem e matam com o aço afiado e frio do boato e calúnia, os segundos cavam a sua própria sepultura levados pelo canto inebriante da sereia que vomita a mentira, encoberta pelo veludo macio das palavras meladas e melodiosas da diva, pois à hora menos pensada “transforma-se o amador na coisa amada”. Estes, serão o Salvador Allende atraiçoados pela ambição política daqueles, os ditadores Pinochet, a quem o primeiro deu a mão. Resta a estes últimos, aos tais chefes que preferem o “ouvi dizer…” sem a coragem de por o dedo na ferida de quem a tem, o poder do padre que lhes ministre o sacramento da extrema-unção.

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Publicado em 12/12/06 no jornal on-line Balaio de Notícias

http://www.sergipe.com.br/balaiodenotícias/alvaro96.htm

Alvaro Giesta
Enviado por Alvaro Giesta em 21/12/2006
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