ROCK’N’RIO : a tônica da semana
 
       A última semana não acabou no sábado. Acabará na madrugada desta segunda feira, quando armas e rosas forem lançadas junto com pedras pela cidade do Rio. A semana acabará quando os astros tiverem se despedido do firmamento, quando as luzes dos spots desplugados deixarem as estrelas sem brilho, quando a roda gigante parada decretar o fim dos movimentos de rotação e translação dos corpos pulsantes, e a tirolesa desativada recompuser a ordem do tempo e da gravidade na superfície da terra silenciada. O som eclético e estridente das bandas de rock serão ondas ecoando ‘ad infinitum’ pelo espaço. Essas bandas parecem compartilhar comigo o desejo de ouvir o som de um planeta rodando, de um sol em explosão, de um cometa fulminando o vácuo intergaláctico, paradoxalmente preenchido de matéria negra. Quando as ouço entendo que, no íntimo, exercícios metálicos do rock almejam ofuscar a música dos corpos celestes rodopiando pelo firmamento.

        E assim, nessa manhã de segunda, juntamente com os astros, com as bandas, com a física e com a astrofísica da música, ter-se-ão partido, também, as notas de maior percussão do espetáculo: a matéria orgânica da vida. Refiro-me os milhares, ou milhões, de espectadores que marcharão ( e não mais pularão entre os spins) rumo a outros destinos não tão metafísicos quanto a magia dos grandes festivais. Diga-se, de passagem entre compassos, que desde as primeiras danças e tambores ao redor das fogueiras ancestrais, nunca tantas tribos tão díspares conviveram com tanta harmonia quanto nas arenas de pedra lascada e polida da atual cidade do rock.

      O sol estará nascendo na manhã dessa segunda entre névoas ( talvez nas mesmas condições climáticas de milhões de anos atrás), o vento sudoeste estará varrendo a poeira, as cinzas e , agora, também o lixo, as carteiras de identidade perdidas, os lenços esquecidos. O silêncio e o vazio recuperarão o direito a um pedaço do solo e do ar. E, talvez o mais importante, muitos continuarão a sonhar.

      Sonharão com a sensualidade híbrida de Shakira e aquele sentimento de mundo que ela carrega em suas músicas, como se fizesse uma viagem de volta para trás na História, partindo, ao avesso, dos sons espanhóis e ingleses das Américas, recapitulando o gosto cigano errante andaluz, retrocedendo um pouco mais pelos legados árabes e culminando nos primórdios africanos: Waka, waka e a própria globalização da música na loura ( oxigenada ou não) que incorpora a África.

      Outros  continuarão a assoviar ‘ wonders’ de onde’ Stiveram’; outros continuarão  a ver os pombos  voarem livres pelo horizonte em direção a sonhos deixados para trás com Elton tão longe. Muitos saberão olhar os sustos do mundo e explicar porque Slip Knots  repetem tantos ‘fucks’ a cada duas palavras cantadas. E que espetáculo aquela bateria rodopiando no ar ! Até as escolas de samba ficaram de pernas pro ar! Te cuida, Paulo Barros!

     Muitos transtornos ficarão registrados ou abandonados pelos retornos, de volta à rotina e diárias do Rio. Porém as rosas, as armas, as alegrias, as dificuldades, e os festivais continuarão a serem lançados nos embates sociais da ruas, nos morros, nos corações bem-aventurados e na violência sem pauta com os quais o Rio, novamente, acorda para mais uma semana...

       E até 2013!

 
Carmem Teresa Elias
Enviado por Carmem Teresa Elias em 02/10/2011
Código do texto: T3253860
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