A palavra é um dom e é também uma espada.
            Dom, porque possibilita a comunicação humana. Através da comunicação a possibilidade de resolver problemas, a aproximação das pessoas, a reconciliação entre inimigos, a concretização de empreendimentos, a transmissão da cultura, o aconselhamento, a expressão de arroubos e temores e mil outras coisas mais.
            A palavra pode evitar mortes e guerras. Pode reduzir o sofrimento e levar alegria ao triste. Pode afastar a ignorância e exaltar a beleza. Pode provar a verdade e confundir a mentira. Pode animar o desanimado e conter o impulsivo. A palavra não tem limite para o bem que pode fazer.
            A palavra pode ser corrompida, pondo-se a serviço do mal. Mas nunca ela acarreta tanta responsabilidade como quando falamos a respeito dos outros, quando falamos mal das outras pessoas. Se o mal que falamos é algo acontecido, estamos difamando. E a difamação não faz bem a ninguém. Nem a quem fala, nem a quem se fala, nem de quem se fala.
            Se o mal que falamos não existe, mas é inventado por nós, então o malefício é dilacerante pois soma a difamação com a mentira. Chama-se calúnia. É o maior mal que a palavra pode causar a alguém. Agravando-se na proporção do mal propalado.
            Todos nós falamos todos os dias. Uns mais, outros menos. Alguns bem mais do que menos. Só os mudos não falam. Se a leviandade nas palavras deve ser evitada, muito mais se deve evitar a maldade das palavras.
            A palavra é capaz de amar. E nisso está o seu valor absoluto.
            Da minha janela vejo um cego que pede esmolas, todos os dias, sempre no mesmo banco da praça. No pratinho de alumínio ele ouve esparsamente caírem as moedas que lhe dão. Um dia alguém sentou-se ao lado dele e se pôs a conversar. Depois de um tempo levantou-se, despediu-se e foi embora. Não depositou moeda alguma.
            Quando veio aqui no fim do dia, para um prato de sopa, disse: “Aqui estão as moedas que ganhei hoje. Mas a melhor coisa que ganhei foi uma conversa que tive com um homem”.
            Perguntei-lhe: “Quem era? Qual o nome dele
            O cego: Não sei quem era. Só sei que é um homem bom!”
            Moedas tornam fácil a vida da gente. Mas sentar-se ao lado e dizer uma palavra é um tanto trabalhoso.
            O cego que pede não vê quem passa. Mas quem passa vê o cego que pede.