Ao lembrar os nossos mortos, estamos lembrando aquelas pessoas com as quais convivemos e que fizeram parte de nossa vida. Se a morte, aqui, é uma despedida, os que morrem vão ao reencontro daqueles que se foram antes. Como os passageiros de um navio que deixam esta margem do oceano, acenando para os que se despedem, para rever na outra margem, os que partiram antes.
            A vida, que é um dom de Deus entregue a nós através da natureza, é algo definitivo que nunca mais nos será tirado. Deus não dá para tirar depois.
            Uma primeira gestação trouxe-nos a esta vida. Este processo natural é a continuação da obra da criação. E passamos do nada para a vida. Não existíamos e passamos a existir. Por isso a vida é um dom de Deus. Não a tínhamos e passamos a tê-la. Dom gratuito que não depende de nossa escolha. O presente é algo oferecido por quem dá e não escolhido por quem o recebe.
            Não vamos ao cemitério para orar sobre cinzas insignificantes. Vamos orar com respeito sobre relíquias de alguém que amamos e que jamais perderá sua identidade.
            A cada ano o Dia de Finados abre-se para nós, como um convite que nos leva a pensar com seriedade naquilo que mais importa: a nossa morte. A pensar também naqueles que se foram e que deixaram em nós algo de si, porque nos amaram. E que, ao partir, levaram algo de nós, porque os amamos. O amor não se perde, como se perdem as coisas desta terra. O amor é para sempre, como o próprio Criador da vida.
            Quando morrem os que nos cercam, principalmente os nossos queridos, nosso coração fica machucado e nós dizemos: “Eles se foram!”
            Lá, onde estão e nos esperam, a linguagem é outra. De nós eles dizem: “Ainda não chegaram! Mas vão chegar e vamos recebê-los com alegria!”
            Lá é o verdadeiro lugar de chegar. É o oceano de todas as águas humanas.
            Aqui é o lugar de passar. Como passam as águas dos rios. Percorrendo as paisagens e buscando de modo inquieto a felicidade serena do infinito.
            Aqui, a terra da saudade, irrigada pelo orvalho penoso das lágrimas e das lembranças que não querem morrer.
            Lá, o território dos encontros e dos abraços comovidos de amor, marcados pela certeza do sempre.
            Lá, acima de tudo, o palácio encantador que Ele preparou para nós! Por Aquele que procuramos em todas as nossas procuras.
            Por que Ele nos quer tanto?
            O amor não precisa de razões para amar. O amor é assim.