Cada vez mais pobre

Cada vez mais pobre

Ano passado, nessa mesma época, fiquei deslumbrada com uma dessas árvores de natal com luz de fibra ótica que enfeitam as vitrines nas grandes lojas dos shoppings. Cismei de comprar uma. Desanimei com o preço: 149 reais. Como o natal é tempo de muitas despesas, fiquei só na vontade e deixei a árvore para outra época, porque havia outras prioridades, como os presentes que eu adoro dar. Nessa semana, tive o mesmo impulso e me lembrei da árvore. Como o normal é que as coisas, quando deixam de ser novidade, tendem a ficar mais baratas, achei que o preço estaria mais acessível. Não estava. Uma, bem menor do que a que eu pretendia comprar, custava nada mais, nada menos que 279,00. Abri a minha bolsa lentamente e de lá retirei meu contra cheque. O meu salário é o mesmo que eu recebi no ano passado. Não aumentou um centavo do nosso salário do mês de dezembro do ano passado, mesmo porque o nosso ilustre governador nos desorientou com um tal de subsídio, onde a gente tinha que optar, e por medo, muita gente optou pelo salário antigo, inclusive eu. Sabe-se lá o que vai acontecer conosco recebendo esse tal de subsídio, que de uma bocada só engoliu nossas vantagens adquiridas ao longo de uma carreira inteira, incorporou nossas gratificações e limitou nosso salário num patamar único, seja início ou final de carreira. Olhei para a árvore e de novo para o meu contra cheque. Olhei para a vitrine e depois para dentro de mim mesma. Quanta coisa, nós, que somos funcionários públicos fomos abrindo mão ao longo de nossa vida para nos sustentarmos nessa profissão tão digna, mas tão desvalorizada que é o magistério. Somos reféns de um cargo que nos dá estabilidade, mas não nos dá condições de sobreviver com dignidade. Acomodamo-nos com o salário minguado e passamos a ocupar mais um, mais dois e até mais empregos para completar o que precisamos para o sustento de nossa família. Depois viramos uns cacos, envelhecemos antes da hora, estressamos, perdemos o entusiasmo com a profissão e ficamos contando os dias que faltam para a aposentadoria. E quando finalmente aposentamos, além caquéticos e alquebrados, nossos pobres trocados nada valem no mercado. O salário mínimo aumenta, aumenta, e aumenta e o nosso permanece, quietinho, intocável. E acontece isso aí... de um ano para o outro, um sonho de consumo tão simples quanto uma árvore de natal quase dobra de preço, e fica mais distante ainda de nossas mãos. Isso, para não falar das outras coisas que não são sonhos, são necessárias e essenciais e subiram na mesma escala. Com a árvore é fácil, arrumo uns galhos secos, uns enfeites do Paraguai e faço um arranjo lindo. Com a vida é que não tem jeito. Não dá para improvisar na sobrevivência, principalmente quando a farmácia também passa ser produto de primeira necessidade, uma conseqüência natural de quem dá o sangue para ser professor.

maria do rosario bessas
Enviado por maria do rosario bessas em 25/11/2011
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