RECEITA DE MÃE

Os tempos modernos vieram para deixar as mulheres em maus lençóis. Hoje a mulher se forma na faculdade e vai direto pro mestrado, demora o quanto pode para casar, enrola o possível antes de ter filhos, compra máquina de lavar louça, lavar roupa, secar roupa, comida pronta e ainda arruma um companheiro pós-Neanderthal o suficiente para passar o aspirador na casa de vez em quando. Com tanto tempo de sobra, o que ela poderia fazer? Trabalhar fora, é claro, já que dentro não há mais tanta necessidade.

E é aí que entram todas as questões da Humanidade. Só para variar um pouco, atualmente tudo é culpa da mãe. As crianças agressivas. Os adolescentes drogados. Os adultos frustrados. Antes o problema era a mãe dominadora, opressora, asfixiante. Agora o problema é que a mãe não tá nem aí. De toda forma, a Psicologia é unânime: a culpa é sempre da mãe. Pobre mãe.

Não que eu considere certas esse tipo de acusações. Mas também não as descarto totalmente. Não pode haver muitas coisas boas nesse escasso contato entre mães e filhos. A cena é clássica: a mãe chega em casa cansada como qualquer trabalhador, o filho chega em casa esgotado como qualquer criança e nem sempre o encontro dos dois é produtivo. Às vezes, só sentar no sofá e assistir calados à famigerada televisão acaba servindo como substituto da devida atenção que um deve ao outro e todo mundo sabe que isso não é nada bom. Inclusive a mãe. Mas essa é uma culpa que ninguém precisa colocar nas costas dela, pois já está em seu coração.

A mãe de hoje é diferente da mãe de ontem. Ela sabe que o seu filho não se contenta com bolinhas de gude e carrinhos de rolimã. Ela sabe que sem saber inglês e informática ele não terá chances no mercado de trabalho. Ela sabe que o sonho de consumo da família não é a casa própria (pelo menos não só a casa própria). Ela sabe que o salário do marido, sozinho, não é suficiente pra tudo o que a família sonha. Ela sabe de tudo isso e quer batalhar. Ela, então, deixa os filhos um pouco de lado. Às vezes mais do que deveria. Mas se é uma verdadeira mãe, sofre com isso. E tenta resgatar.

Eu acredito em mãe à moda antiga. Acho que mãe tem que ser presente, influente, inteligente. E o inteligente não é só rima, é necessidade, mãe tem que ter o que ensinar e ensinar. Acho que mãe tem que ser ativa na vida do filho, mas não metida. Tem que ser conselheira e cúmplice, mas não melhor amiga. Tem que saber se ele transa, mas não os detalhes. Acho mesmo que mãe é quem vê o primeiro passo, ouve a primeira palavra, responde a primeira pergunta. Eu sei que mãe tem que trabalhar e entendo isso. Mas ninguém substitui a mãe, nem mesmo o pai. Simplesmente porque mãe é mãe e pai... Não é mãe.

É provável que as mães, depois de tanto tempo enclausuradas nas chamadas obrigações do lar, tenham se lançado com muita fúria porta a fora. Talvez tenham se precipitado, talvez tenham até exagerado. Talvez tenham perdido o controle na ânsia de provar aos maridos do que eram capazes e vivem agora com toda a culpa do mundo sobre suas frágeis costas de mulher. Porque mãe, antes de ser mãe, é mulher. E uma mulher sempre vai querer ser independente, forte, poderosa. Assim como sempre vai querer um homem, um colo, um filho. De preferência tudo junto, porque misturados, dá uma receita boa. O que falta, na verdade, é acertar as medidas.

Mulher de Sardas
Enviado por Mulher de Sardas em 13/07/2005
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