INDIGNE-SE BRASIL I: A síndrome do país colonizado

Por Herick Limoni*

Caros leitores,

De uns meses para cá, mais especificamente após as “vitórias” do Brasil para sediar a copa do mundo de 2014 e da cidade do Rio de Janeiro para sediar as olimpíadas de 2016, comecei a pensar no quanto o povo brasileiro é ingênuo e decidi escrever sobre isso, como forma de desabafo e protesto. Depois de assistir à comemoração dos membros do comitê organizador da copa, após o anúncio da sede de 2014, e dos milhares de cariocas reunidos, sob um sol escaldante, na praia de Copacabana para esperar e, ao fim, muito festejar a “vitória” da cidade como sede das olimpíadas de 2016, cheguei a uma preocupante conclusão: sofremos e padecemos da síndrome do país colonizado.

A síndrome do país colonizado tem como principal característica a aceitação parcimoniosa de toda sorte de decisões, com pouca ou nenhuma resistência. Tem sido assim desde o dia em que os portugueses, capitaneados por Pedro Álvares Cabral, aportaram em terras tupiniquins, subjugando nossos índios que há muito habitavam essas terras. Desde então aprendemos – muitas vezes na base da coerção – a aceitar as coisas “goela abaixo”, como se costuma dizer. A única coisa que mudou foi a figura dos colonizadores. Hoje somos colonizados e, porque não dizer, manipulados por políticos em busca de dinheiro fácil e rápido, sem nenhum escrúpulo, ética ou pudor. E diferentemente daqueles índios, não apresentamos qualquer forma de resistência. Se estivéssemos em um outro país, provavelmente as coisas seriam diferentes.

Recentemente, na Grécia, o povo se indignou e saiu às ruas contra a decisão do governo de diminuir os salários. Fatos semelhantes também ocorreram na França. O povo árabe, mesmo sob um regime de extremo controle, saiu às ruas em protesto pelos muitos anos sob o domínio dos tiranos, e o resultado foi a derrubada de ditadores que se julgavam eternos. Aqui, a tirania se manifesta através da sucessão dos membros de um mesmo partido político no poder, como é o caso atual. Já se vão quase dez anos de um governo com a mesma receita: assistencialismo como forma de dominação. Como mudar o panorama se a imensa parcela de pobres eleitores da população vive com a merreca recebida do famigerado bolsa família? Como incutir idéias de libertação em um povo que carece de tudo, principalmente de educação? A solução parece estar longe de surgir, e os efeitos dessa nefasta política assistencialista já podem ser vistos nos classificados de jornais e nas agências de empregos, onde sobram vagas no mercado de trabalho e faltam quem as queira ocupar. E olha que nessa semana o Brasil foi alçado ao posto de sexta economia do mundo, com uma arrecadação recorde de R$ 1,5 trilhão em impostos, como se isso significasse melhor distribuição de renda, mais saúde, lazer e educação para o nosso povo.

Toda essa situação me faz lembrar a fábula de Alice no país das maravilhas, que vivia num mundo tão, tão distante. Lá, como aqui no Brasil dos políticos, a vida é um conto de fadas. E nesse ponto sou obrigado a concordar com o colunista José Simão: o Brasil é o país da piada pronta. Basta lembrar da cena daquelas milhares de pessoas em Copacabana, comemorando o direito a uma copa em que a maioria, em razão do preço dos ingressos, só poderá assistir pela televisão. Isso sem falar nos bilhões e bilhões de reais que serão gastos e desviados, cujas obras faraônicas pouco ou quase nenhum legado deixarão para os habitantes das localidades onde estão sendo construídas. Alguém duvida que um estádio que será construído na Amazônia, região sem nenhuma equipe de futebol de expressão, se transformará em um enorme e caro elefante branco? Todo esse dinheiro, se fosse bem aplicado, poderia melhorar a vida de muita gente. Mas quem se importa com isso, se vivemos no país do futebol? Até para sediar uma copa do mundo de futebol, a síndrome do país colonizado não dá tréguas. Basta lembrar que a FIFA, entidade máxima do futebol mundial, está impondo a venda de cervejas nos estádios durante o evento, prática que é proibida por lei já há algum tempo, além de não aceitar a comercialização de ingressos com o desconto da meia-entrada para os estudantes. Essa interferência direta vai de encontro a nossa soberania. Mas quem realmente se importa?

A questão é tão complexa, que quando raramente o povo decide se indignar, o faz de forma desordenada, desorganizada e pelos motivos errados, com raríssimas exceções. Vejamos o caso dos estudantes da USP. Estes mesmos estudantes, que já saíram às ruas lutando pelas diretas já, que pintaram o rosto e conseguiram o impeachment de um presidente, hoje protestam contra a presença da polícia no campus da universidade, pois representa o “Estado opressor”, cerceando a liberdade de nossos “cultos” estudantes, que se vêem tolhidos no seu direito de fumar maconha livremente, como se a Holanda fosse aqui. Por que não se indignar contra a absolvição da deputada Jaqueline Roriz? Por que não sair às ruas contra o expressivo aumento nos salários dos deputados? Por que não manifestar contra os constantes escândalos de corrupção no governo? Por que não lutar por um salário mínimo mais digno? Por que não exigir melhores condições de vida? Por que não fazer valer o direito de meia-entrada nos jogos da copa? A resposta é simples: porque aprendemos a olhar somente para os nossos próprios umbigos. Assim como os índios de outrora, ficamos satisfeitos ao ganharmos espelhos, ainda que os outros não ganhem nada.

Espero que estas poucas palavras fomentem uma reflexão sobre nosso verdadeiro papel na sociedade, ainda que de forma individualizada, pois somente assim poderemos enxergar no outro um aliado na luta contra essa síndrome que não nos permite evoluir, como pessoas e como sociedade.

Aguardem cenas dos próximos capítulos, pois assunto não vai faltar.

*Bacharel e Mestrando em Administração de Empresas, com ênfase em Criminalidade e Segurança Pública