No encerramento da assembléia anual, recolhendo as pastas com os gráficos, a estagiária provocante e provocadora me perguntou:
-Por que devo ser cristã? O que ganho com isso?
-Você não deve ser. Pode ser se quiser. E não ganha nada com isso no sentido de ganho ou lucro direto. Não creio em amizade que seja com interesse. A fé é uma opção e é gratuita.
Mas, ela ainda pergunta, o que caracteriza ou diferencia a fé cristã de outras crenças?
De imediato achei que não saberia o que lhe responder. Nunca me preocupei com o que nos diferencia. Sou bem mais preocupado em compreender o que nos une aos outros.
Mas ela insiste em saber o que é próprio da fé cristã.
Não sei.
Talvez seja o amor incondicional que ama sem pedir reciprocidade e sem cobrar nada e se expressa na cruz, ou seja na doação da vida. Ao menos foi isso o que Jesus fez e o modo como ele nos revelou Deus, como amor capaz de dar a vida por todos.
Em 2012 a assembléia anual da Fundação coincidiu a memória dos Santos Inocentes: as crianças de Belém que segundo o conto evangélico (é um conto) foram mortas por ordem de Herodes. Mesmo sendo uma parábola, é duro pensar que o nascimento de Jesus provocou imediatamente a fúria do tirano e, como conseqüência a morte de tantas crianças e a dor de tantos pais e mães.
No seu evangelho de Jesus Cristo, Saramago que toma esse texto como se fosse relato histórico, critica José porque este, assim que, por um aviso do anjo soube do que iria acontecer, fugiu com o menino e sua mãe e não preveniu os outros pais sobre as intenções de Herodes. Se o fato fosse histórico, ele teria toda razão na sua crítica a José. No relato dos evangelhos, a única intenção era mostrar que, desde criança, Jesus reconstitui o êxodo de Israel, tanto que Mateus encerra todo esse episódio contando que José voltou do Egito com Maria e o menino para cumprir a profecia que disse: “Do Egito chamei o meu filho”.
Pois é. No meio das lutas atuais, não seria mau refazer o êxodo de libertação...