ESCOLA PÚBLICA... PARA OS FILHOS DOS OUTROS

ESCOLA PÚBLICA...

PARA FILHOS DOS OUTROS

Enquanto o almoço não vinha para a mesa, eu fui dar uma espiadinha da sacada. A algazarra de crianças lá embaixo tinha despertado minha curiosidade. Eram os alunos do Colégio S e da Escola T que voltavam do seu primeiro dia de aula para suas casas.

O asfalto mesclava-se cada vez mais de branco e bordô com azul e laranja dos uniformes escolares, e meus pensamentos, à vista deles, se fixaram nas mesmas indagações que eu vinha fazendo aos meus botões havia anos:

Por que as escolas públicas daqui, de nosso Estado, têm merecido tão baixo conceito por parte da população em geral?

Na década de sessenta eu morei em São Paulo e me lembro que as vagas nas escolas públicas de lá eram mais concorridas que nas particulares. Aqui não. Quem pode matricula os filhos nos colégios particulares, e até muitos dos que não podem se sacrificam penosamente, mas pagam o estudo de seus filhos, quando poderiam tê-lo gratuitamente nas escolas públicas estaduais ou municipais, por acharem que nestas o ensino é de qualidade inferior.

Estão certos esses pais em seus conceitos ou é por puro modismo, por questão de status? Terá qualidade inferior o ensino oferecido nas escolas públicas?

Não deveria sê-lo, pois a qualidade dos docentes é a mesma, todos licenciados nas respectivas disciplinas. O comprometimento individual dos professores com a qualidade do ensino também não deveria diferir. Mesmo assim, há evidências dessa inferioridade. Por quê?

Entre os escolares lá embaixo, reconheci uns garotos, filhos de colegas minhas, professoras na mesma escola pública onde eu lutava e labutava por oferecer as melhores aulas de Português. Os garotos também me reconheceram e abanaram para mim. Respondi aos acenos enquanto me vinha o "estalo" e exclamei:

— Eureca! Como é que eu não pensei nisso antes!?

Os garotos acabavam de trazer-me a resposta para minhas velhas indagações. Tantos bate-papos, tantos diz-que-dizes das minhas colegas sobre o custo das mensalidades do Colégio S, a lista enorme de materiais da Escola T, o preço do uniforme do Colégio U... Eu me irritava com elas e não atinava com a verdade que procurava desvendar: se os professores das escolas públicas não valorizam o próprio trabalho, como fizeram essas minhas colegas, que matricularam os filhos em escolas particulares, como é que o povo vai valorizá-lo?

Enquanto os responsáveis diretos pelo ensino do povo (corpo docente-administrativo das escolas) continuarem achando que as escolas particulares são melhores que as públicas para seus filhos, que a escola pública é para os filhos dos outros, não há jeito que dê jeito no ensino público brasileiro.