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             Pois é... diante de nós, às deveras,
somente este retângulo luminoso aonde os sinais vão saltando e formando signos pelos quais estamos tentando uma forma nova de estar nos fazendo presentes na vida do outro.
              E aí você me avisa que estará ausente todo o dia. Signos digitados há mais de uma hora de uma distância de mais de mil quilômetros falando de uma vida à qual eu não tenho acesso, de caminhos, lugares, pessoas que certamente eu jamais irei ver.
             Mas por aqui é fácil a gente criar quadros de existência, misturar o que de verdade, não é possível, como os nossos passos de pés concretos e os apenas imaginados. Entretanto tentamos, e nesta forma incorpórea de contato vamos vivendo um faz de conta para o qual usamos talentos que até nem sabíamos possuir.
             E eu cá a me perguntar o que será, enfim essa tua aludida ausência. Uma ausência da não presença? Então te questiono que não entendi este estar ausente todo o dia... Como assim? Você no Rio, mais ao norte, e eu no Rio G. do Sul. E expresso a minha perplexidade com ironia.... e como? Escrevendo. Email. Palavras que lerás sei lá quando. E lá vai ironia. Enfim, é esta que nos salva do total fracasso diante dessas ciladas repentinas. Mas ela não é amarga, apenas brinca com este novo mundo que mal estamos conhecendo e amplia admiravelmente horizontes.

                " É verdade, eu só te vi no café da manhã .... depois você sumiu...e nem te vi retornar... e continuas sumido... Será que ainda te verei antes do amanhecer? Certamente que não... "
               Aqui somos" ausentes" por condição, ou por inadequação, e outros ãos.... ausentes de corpo e paisagem aonde estamos inseridos, costurados, onde vivemos a nossa rotina de bichos e seres agrupados em sociedade. E onde nos julgamos reais. Aonde imaginamos ter o controle sobre a dita realidade tanto que pessoas temem os perigos da internet como indígenas temiam os trovões.
               Transcrevemos  uma interpretação pessoal de nós mesmos, podemos ser vários,
ser aqueles que escondemos lá fora, ou que lá só revelamos em situações específicas. A nossa verdade aqui é outra, ainda que estejamos com nome e endereço verdadeiros, CPF, telefone, devidamente cadastrados. O que somos mesmo é a nossa palavra e todas as suas circunstâncias.... copiei alguém... mas é isso. A nossa presença aqui é uma espécie de ausência do outro que somos, aquele que se olha no espelho e vai no boteco da esquina, ao salão de beleza, ao cinema...ausência é o que se tem por aqui. Mas ausência do ser rotineiro, transeunte, funcionário, robotizado pela vida organizada e cativa. Aqui fugimos do nosso velho corpo mastigado pelo tempo, podemos nos transcrever em linguagens inusitadas, desafiar a lógica dos formulários, cartões de crédito, Cep, Cic, Rg... Podemos fugir em desabalada carreira para esconderijos aonde a fonte jorra límpida ao lado direito do cérebro. A droga que nos consome e nos recria é apenas um mistério bioquímico e anímico, e enquanto sonhamos, o mundo pode ficar melhor. Somos ausentes que de vez em quando trocam letrinhas, como agora, eu aqui, falando comigo mesma...enquanto eu sonho o instante em que vais saber que te pensei e te vivi no mais profundo de mim.
            Este é o grande barato da hora,  a comunicação se fazendo por outros caminhos. Transpomos a linha do impossível, nos conectamos em segundos, viajamos ciberneticamente.
            Os chamados grandes escritores e os nem tão famosos assim, toda esta casta de aquinhoados por uma certa projeção, poderiam sair do limbo e mostrar-se, dividir o seu pão de privilégios e também seu talento e experiências com mortais como nós que escrevemos como terapia ou por gosto, necessidade ou compulsão, ao invés de acastelar-se em blogs como deuses intocáveis, ou concentrar-se em grupos fechados de escolhidos que temem contatos ou os desdenham por mera vaidade.  Ao invés de apenas
 publicar seus livros escritos na solidão e morrer assim como entidades desterradas,  fariam tanto mais ao tocarem  o Zé Povinho , seria bem mais generoso de sua parte e  não iriam morrer tendo apenas lido as críticas nos jornais, conversado com editores, se reunido com supostos eleitos e enchido a cara, entediados, e ainda alguns poucos tendo  recebido aqueles prêmios vazios em solenidades públicas de uma humanidade esquisita. E assim, quem sabe poderiam escapar de morrer com a barriga cheia de vento de vaidades fátuas, de poeira das bibliotecas solitárias, dos micos nos eventos literários em início de carreira  pra vender e se fazer conhecidos. Sim, nem todos, há exceções, ou houve...  A existência contínua de seres distinguidos com honrarias é uma forma de perpetuar a ideia de que existem pessoas superiores às quais devem-se reverências. De perpetuar o domínio e a opressão. Uma doença crônica... e todos vamos morrer de alguma forma... então???
               Mas volto a ti, amigo, que estarás ausente hoje da tua cidade e gentilmente me avisas. Espero que te agradem esses meus devaneios a partir da tua despretensiosa informação sobre esta viagem que tomará o teu dia. Este lugar para onde viajas pode ser que, geograficamente falando, tenha te posto mais perto de mim.  Mas nós vivemos e convivemos neste novo domínio cujos limites não são palpáveis.  Uma nova geografia mapeada no espaço sem fim, total revolução nas formas de interagir no novo milênio.
               Aguardo, assim, o teu retorno ao nosso singular convívio. No meu relógio são nove horas da manhã cuja existência me chega por um brilho intenso através da janela.  Da outra...

      





                          ***

   Ao retornar após longas ausências, aqui vai o meu abraço estendido nesta crônica ao meu querido GILBERTO DANTAS, um cronista dos bons.  A partir de uma conversa que nos escrevemos, ele, como sempre tão atento com seu olhar de escritor do cotidiano, me falou que o meu comentário a respeito da sua informação de estar ausente num certo dia por motivo de viagem daria uma crônica. E a redigi rapidamente
em início de outubro do ano passado sendo que, agora, a transformei em um texto longo que pretende ser crônica, mas que fica longe da qualidade e leveza das crônicas que ele pinta com as tintas de uma alma colorida.
     Aos que me lerem o meu carinhoso abraço, em especial aos antigos, queridos e sempre lembrados amigos deste Recanto.

 

tania orsi vargas
Enviado por tania orsi vargas em 22/01/2012
Reeditado em 23/01/2012
Código do texto: T3455226
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