Cuidar dos animais é cuidar das crianças

No domingo passado entidades ligadas à causa dos animais de todo o Brasil deram ao país uma verdadeira lição de organização e cidadania. Basicamente através da internet, elas e seus voluntários organizaram a manifestação “Crueldade Nunca Mais”, que aconteceu simultaneamente em mais de 150 cidades, inclusive no exterior, cobrando punições mais efetivas para os que praticam maus tratos contra os animais.

Viçosa, em Minas gerais, também marcou presença através da SOVIPA – Sociedade Viçosense de Proteção aos Animais, com a organização e coordenação de Ankara Nana Romeiro, que faz parte do grupo de mais de cem voluntários da entidade. Na condição de simpatizante dessa nobre causa e também de voluntário da SOVIPA, acompanhei a passeata, que saiu das Quatro Pilastras da UFV e seguiu até a Praça Silviano Brandão, no Centro. Em vários momentos me emocionei ao ver pessoas defenderem seres que são acolhidos em muitos lares como filhos, mas que também vivem por aí no mais completo abandono. Eles estavam lá, representando estes dois grupos: cães bem cuidados, levados por seus donos, e os ainda sem lar, que estão no Canil Municipal para adoção. Como se soubessem que ali estavam seus defensores, também compareceram cães que ainda perambulam pelas ruas, comendo lixo e bebendo água empoçada.

Um fato curioso ocorrido durante a passeata foi presenciado por Cláudia Gomes de Castro – voluntária da SOVIPA que segurava uma faixa logo na frente. Ela contou que no meio da manifestação uma mulher gritou para os participantes: "façam isso pelos seus filhos!". A sua fala, infelizmente, ainda representa a visão de muitas pessoas sobre a dedicação aos animais. É como se fosse uma causa social menor. O que é certo é que os problemas não são excludentes; ao contrário, eles coexistem e uma sociedade inteligente tenta resolvê-los com a mesma dedicação. Animais abandonados, crianças abandonadas, idosos abandonados, sem-teto, sem-terra, sem-emprego, saúde pública ruim, educação pública de má qualidade... Todos são problemas que devem ser resolvidos; nenhuma nação que se queira civilizada, desenvolvida, pode vê-los sem fazer nada.

Há, no entanto, uma diferença básica entre uma criança abandonada e um animal abandonado: a primeira, tão inocente quanto um cão e um gato, tem a seu favor (pelo menos em tese) toda a estrutura montada pelo Estado: creches, escolas, hospitais, transporte, políticas públicas de saúde, bolsa-família e todo o respaldo que a nossa legislação prevê. Além disso, tem normalmente a atenção de diversas entidades do terceiro setor. Viçosa, por exemplo, conta com mais de duas dezenas delas. E os animais abandonados, quem olha por eles? Quem está disposto a recolhê-los das ruas para oferecer cuidados, um lar?

Luciana Macedo, minha esposa e também voluntária da SOVIPA, há pouco tempo foi repreendida na rua por uma senhora apenas por estar alimentando um cão abandonado. A mulher disparou: “tanta criança passando fome e as pessoas alimentando um cachorro". A sua resposta encerrou o assunto: “A senhora tira a criança passando fome da rua? Porque eu tiro o cachorro".

Na passeata do último domingo várias crianças acompanhavam os seus pais, algumas delas com seus animais de estimação. Foi o caso de Layla, de 8 anos, filha do empresário Robson Rodrigues e da educadora Edilene Gomes. Recentemente eles adotaram uma cadelinha numa das feiras de adoção da SOVIPA. Tenho certeza que Robson e Edilene, ao incentivarem o amor de Layla pelos animais, estão fazendo muito por ela; estão ensinando a lição mais básica que alguém pode aprender: o ser humano precisa ter a grandeza de também cuidar do mundo em que vive.