Planador

“- Como é lindo ver um planador aqui da janela”. Hoje pela manhã, voltando pra casa, lembrei dos planadores que sobrevoavam o meu bairro, o bairro que eu morei até os meus oito anos – Parque Eloy Chaves em Jundiaí interior de São Paulo-. Senti uma saudade acompanhada de tristeza.

Em algum dia de julho, lá pelo ano de 1988, eu vi um planador passando por cima da minha casa. Debrucei-me pela janela e estiquei o meu corpo compacto pra fora e olhei para o céu. Fazia um frio... Os meus olhos ardiam, mas e daí? O planador voava mais elegante do que qualquer pássaro.

Nunca ouvi o seu ruído, por isso eu saia todos os dias no quintal e olhava para o céu. Às vezes eu tinha sorte. Com o tempo os planadores e eu criamos uma espécie de intuição.

Um dia resolvi perguntar para o meu irmão mais velho como são todas as nuvens do céu, de que são feitas, e ele me respondeu que elas eram fofas e geladinhas.

- Como você sabe?

- Porque um dia eu fui ao aeroporto e o meu amigo me levou pra andar de planador. Lá em cima eu coloquei a mão pra fora da janela e senti as nuvens nas minhas mãos.

Duvidei, afinal o meu irmão inventava cada história só para mostrar que era mais esperto que eu. Mas mesmo assim, sempre suspeitei que as nuvens eram fofinhas e além do mais, de onde vinha tanto frio? Lá no Eloy sempre fez muito frio no mês de julho. Vai ver que estava certo.

- Pergunta pro pai, ele me levou lá no aeroporto.

- Verdade pai? - Ele confirmou a história e disse que um dia me levaria lá no céu andar de planador também, assim que eu completasse seis anos.

Mas eu já não esperava a minha intuição aparecer. Todos os dias eu olhava para o céu: debruçada na janela, indo pra escola, na laje de casa e principalmente, nos meus pensamentos. O meu irmão inventava histórias, mas o meu pai não. Eu tinha certeza que andaria em um daqueles planadores.

Um dia na escola a professora falou que as nuvens não eram fofas. Ela disse que eram congeladas e depois de muito calor caiam na terra em forma de chuva. Coitada, tão inteligente, mas tão desinformada. Como alguém pode duvidar da “fofura” de uma nuvem?

Fiz seis anos. Não andei de planador. Não toquei nas nuvens e acho que nem o meu pai, pois ele vivia triste e nervoso. Ele nem estava em casa no dia de cumprir a promessa.

Mas nunca perdi a esperança e hoje cedo, eu toquei numa nuvem e posso confirmar que ela é bem gelada e fofinha. Cheguei a caminhar sobre ela, coisa que o meu irmão não fez.

Sou tão livre quanto aquele planador que me visitava freqüentemente, no Meu Céu. E hoje, quase 17 anos depois, eu desci daquele avião com a sensação de missão cumprida.

Mariane Dalcin
Enviado por Mariane Dalcin em 15/01/2007
Reeditado em 27/12/2010
Código do texto: T348103