O Coro dos Contrários na Flip de Paraty

Meu amigo considerou lengalenga as leituras de poesias da Mesa 2 na Festa Literária de Paraty deste ano. Argumentou que, para ter contato com os textos, ele próprio poderia ler, lá no Rio de Janeiro mesmo. Não viera até Paraty para ouvir leituras. Queria debates.

Eu, que me desloquei de mais longe, gostei de ouvir os poetas lendo suas poesias. Surpreendia-me o constrangimento de alguns, tanto quanto a desenvoltura de outros.

Cláudia Roquette-Pinto, revelação aclamada por Heloísa Buarque de Holanda (editora e crítica literária, estudiosa das recentes gerações de poetas brasileiros, e mediadora da mesa), chegou a formular, entre uma leitura e outra, a questão: “Estranho ler poesia, não?” A formulação pareceu-me dúbia: referia-se à leitura em voz alta feita pelos autores, ela inclusive? Ou, é estranho ler poesia, ponto?

O formato da mesa não deixava muito espaço para a participação do público. Este tinha que se contentar em fazer perguntas por escrito, endereçadas a um dos participantes para serem respondidas no final. A voz do público, literalmente, não fora ouvida...E nisto meu amigo tinha razão.

Cláudia, em suas primeiras leituras, dava ares de constrangimento. Ao contrário de Brito (Paulo Henriques Brito) que dava a impressão de estar bastante à vontade, e contava com a possibilidade dos ouvintes acompanharem a leitura de seus poemas no impresso que sua editora, a Companhia das Letras, tivera o cuidado de distribuir aos que faziam fila para ver “Coro de Contrários”, que contava também com a participação de Alberto Martins (poeta e gravurista).

Cláudia, na seqüência, usou do recurso de contar um pouco da história de cada poema. Deu certo, proporcionou um clima mais intimista. Seu constrangimento diminuiu e o da platéia também.

Ocorre que a poesia de Brito é irônica, sarcástica, capaz de provocar uma reação imediata. A de Cláudia soa densa, pede um certo afastamento e retorno. Ela estava lançando o livro “Margem de Manobra”, cuja remessa para Paraty estava com atraso... Acabei comprando o anterior, “Corola”. Li alguns poemas, com pressa. Estou na fase de afastamento, para um retorno mais demorado.

Finalmente, as perguntas que não queriam ser respondidas. Alguém perguntou à Cláudia se ela concordava com Clarice Lispector (a homenageada desta Flip), que disse: “ser poeta é não pertencer”, ou algo parecido, ao quê obteve-se a rápida resposta: se Clarisse disse, é mais fácil concordar, não é?

Burburinho na platéia.

Mas, e que ótimo mas, nem só de mesas redondas se faz uma Flip. Fazendo o “coro dos contrários”, havia lançamentos de livros, exposições e shows paralelos, no Casarão do Cunha. O Casarão fica afastado do Centro Histórico de Paraty, que concentra a maioria dos eventos. Afastado dos tropeços em Arnaldo Jabor e companhia. A caminho do Casarão, tropeçamos no Lingo Lingo, misto de boteco e quase restaurante de estrada, que serve um super almoço. No Lingo Lingo não havia lengalengas. Lá debatíamos, à vontade.

Rocio Novaes
Enviado por Rocio Novaes em 16/07/2005
Reeditado em 17/07/2005
Código do texto: T34832