O GAROTINHO

Fiquei o dia todo com o guri na cabeça.

Vou contar como foi tudo.

Ontem à noite eu aguardava num ponto de ônibus um que me trouxesse pra casa.

Era bem tarde já.

Uma chuva fininha e fria caía quando uma jovem se aproximou trazendo pela mão um menininho lindo.

Ele tinha os olhos febris, o cabelo repartido de lado. Notei que o cabelo era bem pretinho, brilhante e parecia feito de veludo.

A moça era realmente muito jovem e me perguntou se eu tinha visto passar um certo ônibus.

Notei o quanto ela cheirava a cigarro e vi que era bem bonita.

Respondi que tinha passado sim há menos de dez minutos e ela lamentou tê-lo perdido.

O garotinho tinha a respiração cansada e a mãe foi me contando que estavam saindo do pronto socorro onde ele fora medicado (a esta altura ela já o tinha chamado de filho várias vezes).

O garoto sentou-se no banco encharcado. A mãe procurava abrigá-lo da chuva, mas estas chuvas de verão costumam vir acompanhadas de ventanias e estava bem molhado o banco.

Fiquei olhando-o e achando-o tão bonitinho.

Nenhuma vez ele se queixou. Ficava quietinho e respirando com certa dificuldade. Tinha os olhos tão tristinhos, mas eram olhos lindos. Grandes, negros, sobrancelhas bem arqueadas, cílios longos.

Eu ficava a olhá-los e como desejei ter uma quantia maior em dinheiro na carteira. Eu os ajudaria a pegar um táxi (estava desprevenida e eles moravam bem longe).

A hora passava. O ônibus não vinha e o garotinho permanecia quietinho, encolhidinho.

Me deu uma pena danada. Pensei nele crescendo.

O que o mundo vai oferecer a esta criança?

Me deu uma sensação tão ruim. Pensei que pode se tornar um marginal.

Ficamos tão impotentes muitas vezes, mas sei que não posso pensar assim. Temos que ter pensamento positivo.

Minha condução chegou antes que a deles chegasse. Hoje me lembrei muitas vezes daquela carinha linda e desejei melhoras. Imaginei-o brincando e feliz.

Puxa. Este é apenas um fato, pois tanta coisa acontece. Mas meu coração ficou doendo e quis contar em homenagem àqueles olhinhos lindos.

Tomara que hoje estejam brilhando, mas não de febre. De felicidade.

SONIA DELSIN
Enviado por SONIA DELSIN em 16/01/2007
Reeditado em 25/03/2011
Código do texto: T348492
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