Como libertar-se dos vícios

As altas temperaturas de fevereiro atingiam o apogeu dos quarenta graus e me bronzeava caminhando pela pista de pedrinhas, que margeava a represa Billings.

Em minha direção caminhavam dois homens trajando paletós deselegantes com largas ombreiras, gravatas laranjas sobre camisas azuladas, à maneira dos evangélicos. Pararam para observar uma família de reses que pastava devorando a grama baixa.

Um deles, branco e aparência nordestina, destacou um folheto em que apareciam dois pulsos agrilhoados, fazendo força para se desvencilharem e me entregou, proferindo as seguintes recomendações: "aceite à Jesus meu jovem, você e sua família, vá até a igreja mais próxima e..." peguei logo e agradeci.

Evidente que li o conteúdo do prospecto da igreja Deus é Amor, e era óbvio que este conteúdo era de proselitismo cristão, frases muito comoventes: "o vício é um parasita" "rouba o bem precioso da saúde" "a bebida, mata" "o cigarro, mata" "as drogas, matam" ("o sexo, mata" pensei como o mais puritano dos crentes deveria pensar) "você não foi criado para viver assim".

Ao final, após citação do escritor João, o evangelista, a pergunta decisiva: "você deseja ser liberto e dar início a uma nova vida agora mesmo?" quadradinho "sim" quadradinho "não".

Penso que o vasto e milenar império cristão não deveria nos dar o direito de escolha, pessoas como eu e você, querido leitor, adeptos do entrar em portas largas, do sentar para beber com os escarnecedores, devem ser tratadas com rigor férreo.

Gozando deste oportuno direito, marquei o xis no quadradinho do "não" afinal é domingo de carnaval e a Portela vai passar, abrindo caminho com sua águia e o Paulinho da Viola à bordo.