GADO BRAVO

O texto a seguir foi extraído de “Crônicas da Vida Inteira”, livro inédito sobre fatos da minha vida, adaptado para o Recanto das Letras.

GADO BRAVO

Um dos meus passatempos preferidos era subir em bando nas árvores frutíferas e saborear lá em cima as frutas deliciosas ou fazer guerra, jogando frutas ou bagaço delas uns nos outros ou mesmo, por malvadeza, fazer xixi na cara de alguma rês que estivesse embaixo da árvore. Fazíamos até concurso de pontaria.

Cada uma a seu tempo. Época das laranjas, das jabuticabas, das gabirovas... Algumas destas árvores ficavam no meio do pasto onde havia gado bravo, e quando nós íamos a elas, tínhamos que tomar cuidado.

Numa tarde de domingo, quando nós estávamos chegando à gabiroveira, um touro nos viu de longe, bufou e veio. Por sorte a árvore era de subida fácil, e nós escapamos mais que depressa.

O patife do animal veio, rodeou, bufou, rodeou e, cansado da tocaia, deitou-se bem embaixo. Julgando que ele se mandasse logo dali, nós chupamos gabirova à beça e brincamos a mais não querer lá em cima e acabamos nos cansando de tanto nos segurar pra não cair. E o safado do touro lá embaixo deitado numa boa. O que fazer? Como afugentar o bicho dali? As bexigas já estavam vazias do concurso de pontaria. Fizemos guerra de gabirova contra ele, mas de nada adiantou. O boi sacudia a cabeça enfezado, mas não se mancava. Embirrou mesmo. Pelo jeito o danado tinha decidido passar a noite ali. Só nos faltou ouvi-lo cantar aquela marchinha de carnaval: “Daqui não saio, daqui ninguém me tira...”.

Nossa esperança era que passasse alguém na estrada pra pedir socorro. Mas qual o quê! Não aparecia um vivente pra socorrer a gente. Depois de muito tempo, quando nós já estávamos dispostos a enfrentar a fera, apareceu um conhecido que nos atendeu prontamente, enxotando o touro, que correu feito covarde. Foi aí que nós vimos que o nojento do animal era muito do prevalecido. Era bravo só pras crianças.