Eu passarinho

Eu Passarinho!

Crônica de Otrebor Ozodrac

Devia ser em torno de 10 horas da manhã, de um dia ensolarado. Eu estava sentado numa cadeira de balanço sob o alpendre da minha casa de campo. Naquele momento estava descansando e aproveitava para tomar um chimarrão. A frente de onde me encontrava, há uma distância, de mais ou menos, cinco metros havia uma composteira, local onde se coloca lixo orgânico para fazer adubo. Naquele momento na composteira, havia restos de arroz, que a pouco eu lá colocara. Como de costume, um casal de tico-tico, estava fazendo a refeição matinal. Também um João de Barro ali estava chegando sem se preocupar com a minha presença, que lhe era familiar.

Entre um chimarrão e outro, apreciava os passarinhos, agora um casal de Carrueirinha havia chegado, um Ben-te-vi fez um vôo rasante e pousou na cerca de arame, para logo alçar o vôo e pousar na lateral da composteira. De um salto, adentra no contentor e começa o seu refaz. Com a chegada do Bentevi, o casal de tico-tico satisfeito partiu. O João de Barros dava as suas últimas bicadas.

A mais ou menos, cinco metros da composteira um pássaro, para mim desconhecido, saltitava entre galhos e a cerca. Ora nos galhos de uma jovem goiabeira, ora na cerca de arame. Ele parecia muito desconfiado, olhando para todos os lados. Quando eu me movimentava, para encher o chimarrão, ele voava para longe. E, logo de espacejo, se aproximava todo receoso.

Ele era do tamanho de um Sabiá, suas asas eram cinza brilhante, as penas do pescoço e da cabeça de um verde escuro que quanto mais se aproximava do tronco ia se tornando cinza. O bico era acunto, como o de um periquito.

De repente ele parece ter criado coragem, pousa na lateral da composteira. O João de Barros voa para longe, com a sua chegada, o mesmo fizeram as duas Carrueirinha. Ele desconfiado torcia o pescoço e olhava para todos os lados. Eu nesse momento fiquei imóvel a contemplá-lo. De repente ele pula para dentro, pega uma porção de arroz e voa para o ipê. No galho, escondido entre folhas come o arroz, alguns grãos caem ao chão. Contei, por cinco vezes, ele usou essa estratégia, na sexta, pulou e ficou comendo, dentro do contentor, de quando em vez, parava e olhava para todos os lados e logo continuava. Após saciar-se pulou para a lateral, olhou para todos os lados, esfregou o bico na madeira, para limpá-lo, torceu o pescoço, levantou a asa, e com o bico catou algo debaixo dela. Eu, ali imóvel contemplava aquela obra prima da natureza.

Absorto em meus pensamentos imaginava sendo aquele passarinho. E, nessa em uma abstração sem igual, me via ali no seu lugar, vendo aquele ser imóvel naquela cadeira, um ser imenso, dentro das minhas proporções de pássaro de pequeno porte. Com membros longos feitos galhos de árvore, cabeça redonda como uma laranja, no lugar de um bico, um buraco. Que horrível aquele ser que me espreita Quão ameaçador é aquele ser, mas que me proporcionara alimento para o dia inteiro, não necessitando, pelo resto do dia, ficar perseguindo insetos, ou minhocas e outros rastejantes. Agora com a fome aplacada, podia voar para lá sei onde, bastando apenas bater as asas e meu pequeno corpo cheio de sacos aéreos, penas e plumas, flutuava ao vento, numa revoada. Um simples bater de asas, me levaria ao alto das arvores mais estrondosas, meus olhos poderiam ver toda aquela imensidão, inclusive o homem que trabalhava na roça, ou seria um espantalho?

Do alto flutuando na minha abstração fico refletindo.

“Que diferença em ser homem ou ser um pequeno pássaro, tenho como homem, a possibilidade de viver mais, mas após a morte ambos nada significaremos, pois, com o tempo àquele que de mim se lembrarem dirão”:

“Meu tataravô nem sei o nome, nenhuma foto dele foi conservada, sua existência foi apagada.” O passarinho, nasceu, viveu e morreu dele nada mais restou, assim como eu caímos no abismo do esquecimento. Eu pássaro, eu homem, tudo igual, seremos nada um dia.

De repente o pássaro voa. E, eu que estava voando alto despenco e caio na cadeira sentado. O João de Barros se aproxima e pousa na composteira. Fico pensando, será que o pássaro encantado voltará amanhã?

Otrebor Ozodrac
Enviado por Otrebor Ozodrac em 11/03/2012
Código do texto: T3548576
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