Socorro, Pronto Socorro

Esporadicamente vê-se nos noticiários brasileiros a vida por entre os corredores de nossos hospitais públicos. Em geral são imagens desfocadas, frutos de câmeras escondidas, mas mesmo estas podem captar angustiantes momentos. Como a ultrajante permanência nos corredores de um hospital, nada mais absurdo do que receber atendimento nestes em: macas, cadeiras escolares, até mesmo em pé ou ao chão. A regra das disposições por paciente é conforme a gravidade da situação. No entanto o corredor é o leito por tempo incerto, tempo esse que quanto mais você passa mais angustiante lhe é, a começar pela sala de espera. Em situação não muito recente permaneci um considerável tempo na sala de espera de um Pronto Socorro, o que me oportunizou ver suntuosos lances como: pernas quebradas, de tal forma que eu não consiga imaginar que um dia será reconstituída, homenzarrão com ferimento na cabeça escondendo-se para não o verem chorar, ou ainda mães em desespero com seus filhos convalescendo em seus braços.

É, e a espera continua... Porque a lógica de atendimento é por ordem de desgraça (ou melhor, dizendo gravidade) e não por ordem de chegada. Nada mais justo, mas isso traz em mim (q fui ao PS por simples problema alérgico) um sentimento de culpa por estar ocupando tempo e espaço de outra pessoa com problema pior. Sentimento reforçado pelo médico, orientando que eu deveria ter procurado o posto de saúde do meu bairro.

Bom! Minha resposta é única: Se a alergia tivesse me avisado de sua chegada eu teria agendado uma consulta – com duas semanas de antecedência - para este referido dia. Pois no Postinho do meu bairro é assim: consulta, só agendando com no mínimo duas semanas de antecedência. Depois de mais um “quando for assim não venha ao PS,” - afirmativa do profissional da saúde, que eu entendo e concordo perfeitamente - veio o diagnostico e a receita, e me resta trilhar corredores até a saída em que observo cenas que certamente ocorrem diariamente nos corredores: o paciente que reclama da demora em seu atendimento e o médico e/ou enfermeiro que justifica “estou fazendo o trabalho de três”.

E a situação é exatamente esta, é difícil fazer milagre. Tenho a ligeira impressão que deve ser complicado trabalhar num espaço insuficiente, com menos profissionais que o necessário, escassez de material, reclamações constantes e ainda executar com agilidade, destreza e eficiência as tarefas que dizem respeito a nada mais nada menos que a vida de seres humanos. Que profissão difícil!

Ao ver os profissionais da saúde em um Pronto Socorro, me lembrei daquele personagem de seriado norte-americano, o “Magaiver”. Ele realizava sozinho, tarefas das mais absurdas e perigosas com um mínimo de material. No entanto, até o Magaiver para construir uma bomba, por exemplo, precisava de uma mola, um parafuso e um chiclete. No caso dos nossos “Magaivers” da saúde, falta-lhes o mínimo de material, sendo assim muito mais difícil realizar as tarefas absurdas e perigosas do dia-a-dia de um Pronto-Socorro.

Talvez analogia com bomba não seja das melhores porque a idéia não é destruir, não se defende aqui a destruição do Sistema Único de Saúde. Muito pelo contrario, construir, ampliar, e urgentemente melhor administrar.

O sistema já tem problemas, levando em conta a verba que é repassada pelo governo federal (que é insuficiente e consegue ser reduzida ano após ano). Pior ainda, se os administradores municipais não gerenciarem a saúde com a concepção de prioridade que o tema precisa, nossos corredores estarão mais cheios e nossos Magaivers estarão trabalhando por 10 e não por três.

Júlio Cé
Enviado por Júlio Cé em 17/03/2012
Reeditado em 11/08/2020
Código do texto: T3560325
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