O POETA DA REPARTIÇÃO
Seu Simão era muito querido na repartição onde trabalhávamos. Com bem mais de sessenta anos ele esperava a aposentadoria chegar, e enquanto esperava cantava ou melhor criava as letras das músicas que seriam no carnaval, o enredo da sua escola de samba, a Baiana.
A mim, sua colega mais jovem, cabia a tarefa de, nas horas vagas ou intervalos, datilografar seus textos, cheios de poesia, que seriam repetidas na avenida: “...suas pupilas se dilatarão vendo a escola passar e a plateia não se engana só pode ser a Baiana...”.
Seu Simão era casado com Dona Larinha, uma senhora gorda e faceira que, segundo ele, era a mais bonita de toda a escola e já tinha sido até Porta Bandeira.
E assim nossos dias na repartição eram alegres pois o seu Simão era só festa, até o dia em veio a sua aposentadoria. Seu Simão não pensou duas vezes, todos os valores recebidos ele usou para cus- tear a gravação do seu disco, creio que o primeiro e único. Lembro que na capa do compacto havia a foto de um negro sorridente de calças brancas, subindo as escadas da praça da Matriz. Sonho realizado .
Continuamos mantendo contato com o seu Simão até o dia que soubemos que na volta de um baile, Dona Larinha teve um ataque do coração e morreu, ali mesmo na entrada do quarto, de vestido de festa.
Foi um choque para todos. Os comentários corriam: “ Agora é o fim do seu Simão, ele vai se entregar pra bebida, pra sarjeta. Vai morrer...”
Morrer? que nada. Passou um tempo e soubemos o destino do seu Simão: Rio de Janeiro. Sim, ele tinha realizado outro sonho. Conhecer a Cidade Maravilhosa.
A vida voltou ao normal na repartição. Até o dia em que, para surpresa geral, adentrou-se no escritório aquela mulata trintona, muito bonita que disse: “sou a nova esposa do seu Simão e vim buscar uns papeis porque ele vai ser papai”!!!!!