Por amor

Serena! Esse era o nome de uma adolescente de 13 anos, muito bonita esguia, bem feita de corpo, na verdade quase uma mulher. Aproximava-se de 1.67m de altura, fato raro entre as mulheres de sua descendência indígena. Cabelos negros lisos pela cintura, mais pareciam um âmbar, às vezes os enfeitava com uma pequenina coroa de flor de laranjeira, colhidas no fundo de seu quintal. Por onde passava desencadeava no sexo masculino os desejos mais profundos e libertinosos. Nas mulheres provocava a ira e a inveja. Em seu rosto trazia os traços de um sofrimento incomum para a sua idade, por volta de 1970 tivera sua primeira filha, uma linda menina, loirinha, de olhos azuis, um verdadeiro anjo. Tão nova apaixonara-se e fora iludida, acreditara mesmo que o homem que a ajudara a conceber a criança se casaria e que a criariam juntos o bebê. Enganou-se, antes mesmo da criança nascer fora abandonada, antes mesmo de completar seus 14 anos. Seu pai por sua vez, homem zeloso dono de uma moral familiar sem igual a expulsou de casa apenas com a roupa do corpo. Ao relento, Serena dormira por noites e noites com o bebê nos braços...Esfomeada, a amamentava, e suas forças iam se esvaindo dia após dia...A fraqueza ai tomando-a por inteiro...

Logo aparecia um rapaz prometendo mundo e fundos, e mais uma criança era concebida ali mesmo ao relento, querendo acertar o erro aceitava as condições precárias que lhe eram oferecida e a cada nascimento uma desilusão, o abandono absoluto! Agora aos 19 anos a beleza da jovialidade mais que nunca imperava e agora com mais força, apenas seus olhos entregavam-lhe o sofrimento. Morava agora num rancho no meio de uma floresta quase que virgem. Sozinha e sem luz e água potável, o choro e a fome eram inevitáveis. A cada amanhecer mais um dia se passava e nada mudara, não suportava ver a precariedade em que vivia e seus cinco filhos morrendo a minguá. Imensurável era a dor! Precisava tomar uma decisão! Precisava alimentar seus filhos. Não os deixariam morrer por algo que todos tinham o direito. O alimento!

Em uma noite de Setembro muito fria, sentada num tronco de arvore que lhe servia de banco no quarto vazio, o pavio de uma lamparina queimando num último fio de querosene, iluminava o pequeno ambiente. As crianças dormiam feitos anjos num colchão de casal propositalmente colocado num canto onde as gotas o orvalho não alcançassem...Nenhum lençol, nenhum cobertor cobriam aqueles pequenos corpos inofensivos...Foi então que de súbito tirou de uma caixa de papelão um curto vestido que ganhara junto a outras peças em uma ocasião em que uma senhora a vira tão maltrapilha e resolvera doar-lhe umas peças limpas. Vestira deixando as grossas coxas à mostra e um colo saliente à vista, escovara os longos cabelos e colocara a tiara de flor de laranjeira que sempre trazia uma consigo, no tornozelo colocara uma corrente de barbante com as mesmas flores, sapatos não os tinha, decidida partira. Numa esquina mais movimentada da Cidade parara junto a outras que ali estavam e logo parara um carro, conversaram e saíram. E assim fora toda por toda à noite, clientes não lhe faltaram...

Ao amanhecer voltara para casa com os braços cheios de sacolas de supermercado, as crianças ainda dormiam. Sobre uma pequena mesa de madeira maciça deixada por quem ali tivera, postou leite quente com chocolate e pães fresquinhos recheados de queijo fresco. Sobre o fogão a lenha colocara o feijão, arroz e um pedaço de carne pra cozinhar em caldeirões de alumínio amassados escurecidos pelo tempo. Enfim teriam um café da manhã e um almoço digno que ela jamais deixaria de dar a seus filhos queridos dali por diante...