Já Deu Saudade

Há alguns anos planejo esta viagem a Natal, sem sucesso. A cada programação de férias, Zelinha reitera o convite de ficarmos em sua casa de praia. Com a intenção de levar Anita e Diana novamente até o mar, empolgo-me com a ideia, mas logo impedimentos surgem e a viagem fica adiada.
Desta vez, finquei pé e o marido acabou cedendo. Meio a contra gosto, mas bem que se divertiu. Fomos sem Diana, que nos deixou no início deste ano e também sem Anita, para quem pensamos que a viagem de avião seria muito sacrificada e, na ausência da irmã, o passeio talvez ficasse insosso. Mas, em nossas lembranças e imaginação, as duas aproveitaram demais a praia tranquila e quase deserta, com trechos cheios de grandes pedras pretas, irresistivelmente cheiráveis para qualquer bicho movido a faro.

 
Aproveitamos o ambiente marítimo, os odores e sons tão característicos, a gastronomia local, o visual deslumbrante com direito a golfinhos corcoveando alegremente nas águas mornas e um ritmo bem diferente do que estou acostumada, com muita preguiça, sem culpa.
 
Se não bastasse, no domingo fomos recebidos pela escritora Zélia Freire e sua família para um almoço feito pelo Thales, seu genro e, como ela, persona gratíssima. Aliás, toda a família é assim. As filhas, Cláudia e Zélia (que super gripada, prestigiou a nossa presença), o filho Marcelo, o outro genro, Nelson, os netos (estes, embora educadíssimos, não nos deram muita trela, mais interessados em seus assuntos de gente jovem, bonita e cheia de energia). Conhecemos também a poeta Yasmine, de quem Zelinha é fã e amiga, com razão. A moça e seu marido, Ivan, nos proporcionaram momentos bastante agradáveis. Pouco depois que chegamos, Zelinha anunciou a surpresa: uma convidada especial. Já adivinhei logo quem seria. É que, durante todo o tempo que antecedeu a viagem, pensei em lembrar Zelinha de convidá-la para juntar-se a nós, mas sempre em momentos que não era possível falar-lhe. Assim, não foi surpreendente, mas foi fascinante conhecer também, ao vivo, à cores e simpatia, a escritora Evelyne Furtado, de quem sou grande admiradora, pela qualidade poética quase etérea de seus textos e pela doçura e gentileza, sempre presentes.
Foram horas de encantamento e, ao mesmo tempo, de tanto acolhimento, que sentimo-nos em casa. Até o meu marido, que costuma ficar meio tímido fora de seus ambientes costumeiros, soltou-se, conversou e riu um bocado. Não foi diferente quando, na quarta-feira à noite, fomos recebidos na casa de praia vizinha, do sobrinho, Otto e Marlúcia, sua adorável esposa que, por estarem concluindo um negócio em João Pessoa no domingo, não puderam estar presentes no almoço. Lá, deu-se um festival de piadas para cearense nenhum botar defeito.
Ainda tivemos um último encontro, na noite de nosso retorno à Brasília, quando Marcelo nos buscou na praia e jantamos com nossa anfitriã pela última vez.
Zelinha é exatamente como parece ser, por suas fotos, textos, e-mails e os poucos telefonemas que trocamos, avessas, eu e ela, a longos colóquios pela invenção de Graham Bell.

 
Sua casa de praia é um aconchegante paraíso à beira mar, localizado na Rua Escritora Zélia Maria Freire. Chique demais, ter uma rua com seu nome, e Zelinha tem!
É pouco, para uma imortal da Academia Feminina de Letras do Rio Grande do Norte e também para a pessoa que Zélia é. O tempo ao seu lado voa, escasso para tantas histórias, tantas opiniões, que defende com graça descompromissada de quem já alcançou na vida tudo aquilo que um dia almejou e faz questão de partilhar. Cada mínimo detalhe, tratado com carinho, a casa abastecida com tudo do bom e do melhor, as redes penduradas, só esperando nosso cansaço, toalhas de praia e cangas, chapéus e um joguinho de frescobol, tudo ali, ao alcance da mão. Chegou ao extremo de colocar uma foto de cachorrinho no celular que fez questão de deixa comigo, para facilitar nossa comunicação durante a estada.
Resultado? Antes de embarcarmos no avião que nos traria de volta, já estávamos com saudades.

 
Na bagagem, energias renovadas e muita gratidão por essa amiga tão especial que, para nos receber, varreu caprichosamente o lindo mar de Tabatinga.