Guerra e Paz, de Portinari

No início da década de 1950, a Organização das Nações Unidas sugeriu que os países integrantes enviassem obras que os representassem culturalmente, para que ficassem expostas na sua sede em Nova Iorque. O governo brasileiro, então presidido por Getúlio Vargas, escolheu para essa empreitada o artista Cândido Portinari, que, por sua vez, entre os temas oferecidos para serem desenvolvidos, escolheu “Guerra e Paz”.

Foram centenas de estudos e quatro anos de dedicação integral a essa que seria a maior – e uma das últimas – obras de sua vida. Estava proibido de pintar por ordens médicas, visto que já estava contaminado pelo chumbo das tintas. Mas levou o projeto até o fim e o resultado foi a criação de dois imensos painéis, cada um medindo 14 metros de largura por 10 metros de altura; um a Guerra, outro a Paz.

Não apenas impressiona o tamanho, mas principalmente a riqueza de detalhes e a força das imagens, com os traços e o colorido típicos do genial artista nascido em Brodosqui, interior de São Paulo, em 1903 – e que nem sequer chegou a concluir o ensino primário. Os dois gigantescos painéis ficaram expostos no hall de entrada da Assembleia Geral da Onu em Nova Iorque até 2010, quando, por ocasião da reforma das instalações locais, surgiu a oportunidade de trazer os painéis para o Brasil a fim de serem restaurados, o que aconteceu até maio de 2011.

E agora a obra maior de Portinari está exposta, devidamente restaurada em suas cores e brilhos originais, em São Paulo, mais precisamente no Memorial da América Latina. Uma oportunidade única de conferir esta obra que emociona não apenas pela força das imagens, mas também por ser uma comovente história de dedicação.

Os cavalos, as feras, as pessoas em desespero, as viúvas chorando, os órfãos de olhos vazios, as mãos em prece, os corpos mortos na Guerra; os trabalhadores do campo, as crianças (muitas crianças) brincando, a noiva sobre o cavalo, as jovens dançando, as pessoas podendo viver e trabalhar livremente na Paz. Para que essa combinação de formas e cores (predominando o azul na Guerra e os tons dourados na Paz) pudesse se materializar, Portinari fez inúmeros estudos, em crayon, lápis de cor, óleo sobre madeira ou apenas grafite. Vários desses estudos viraram obras autônomas, belos quadros completos que na verdade são detalhes da obra maior.

Além da aflição que o painel Guerra suscita ou da emoção que escorre, singela e possível, do painel Paz, o que toca também é a percepção que o artista teve de seu momento histórico: a consciência de que aquele trabalho se tratava da obra capital de sua vida e a necessidade de dar a ele a devida importância, na busca da perfeição que sem dúvida foi atingida. A alegoria desse movimento pode ser traduzida por envolvimento de corpo e alma.

Pouquíssimas pessoas possuem o talento de Portinari, mas todos temos dentro uma enorme capacidade de dedicação e superação.

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Exposição dos painéis Guerra e Paz, de Cândido Portinari (1956)

Memorial da América Latina - Av. Auro Soares de Moura Andrade, 664

São Paulo, SP - Ao lado da Estação Barra Funda do Metrô

Terça a domingo, das 9 às 18 hs - Entrada franca

Até 21 de abril de 2012