A Frustração do Aristocrata

O homem olhava-se no espelho com indignação, o tempo não fora tão bom com ele, suas manchas e rugas não deixavam esconder a velhice que se aproximava. Seus cabelos grisalhos cresciam apesar da relutância deste em ocultá-los, acabam transparecendo conforme os gestos e movimentos que articulava.

Membro da mais alta sociedade tirava regalias governamentais, além de estar constantemente incluso nos bailes da aristocracia, nos quais era requisitado pelas polcas que escrevia, as quais já estavam não só na boca da elite como na do povo. Tanto que costumeiramente ouvia assovios de transeuntes nos ritmos destas. Tinha tudo o que qualquer pessoa queria, sua fama extrapolava os limites da época, porém não era o suficiente para ele.

Mozart, Chopin, Bach, eram o seu “sonho de consumo” tornar-se um homem imortalizado, um grande compositor como estes, e não um simples compositor de polcas. Pela noite entregava-se a frustração trancafiando-se no quarto e punha-se a tocar até o amanhecer, naquelas horas em que se encontrava frente ao imenso piano, vivia tudo aquilo que sonhava, até os aplausos parecia escutar ao terminar cada sinfonia.

Após noites, em claro, sinfonias escritas, reescritas, outras tocadas, outras rasgadas. Notas soltas por imensas folhas de papel, nas putas e compassos ali presente, entrelaçando ritmo e um valor imensurável a cada nota, o compositor de polcas teria criado aquilo que em sua visão era o cume de qualquer outra sinfonia já escrita ou já ouvida.

Aperfeiçoando tudo, resolvera arriscar levando-a ao dono da gravadora, ansiando que esta fosse gravada.

Pura frustração, o editor da gravadora não quis gravá-lo. Achou a obra magnífica, porém sabia que uma polca venderia mais do que tal sinfonia.

O homem saiu decepcionado, se entregou a bebida e a outros desprazeres da vida, porém a necessidade o fez retomar a carreira musical, apesar do retorno suas polcas não continham mais o mesmo brilho de antes, em cada nota seja esta tocada ou assoviada, continha a frustração de um homem com um sonho não realizado.

O aristocrata veio a falecer meses depois graças a uma pneumonia mal curada já que na mente do fidalgo apenas estava o sonho e a frustração, além da luta para que aquilo desse certo. Do mesmo modo que o personagem machadiano “Pestana”, o aristocrata nunca se satisfez com a fama que tinha, gananciava sempre mais e mais, transformando um sonho não realizado em uma ferida denotada frustração.

Vinícius Bernardes
Enviado por Vinícius Bernardes em 04/04/2012
Reeditado em 04/04/2012
Código do texto: T3594664
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