UMA ESPIADA NO CÉU DA MINHA INFÂNCIA.

Por vezes, deitava no chão do meu quintal e ficava observando as nuvens e na minha imaginação pueril eram só figuras fantasiosas e castelos no ar que logo se desfaziam.

Quando nuvens acinzentadas se faziam presentes, eram gigantes que me atemorizavam e que, para meu alívio, se desmanchavam numa daquelas chuvas gostosas das tardes mornas. Ao cair da noite, esta mesma chuva presenteava-me com novas impressões, e olhando da minha janela, suas gotas pareciam pedacinhos de prata caindo do céu, e o seu barulhinho no telhado era uma alentadora canção de ninar.

Outro visitante do céu da minha infância era o senhor arco íris, raro nas aparições, mas impressionante nas suas cores. Sempre diziam que no seu final poderia existir um pote de ouro, e eu ficava imaginando os tons dourados deste possível tesouro. Entretanto, esta idéia logo se dissipava da minha mente, pois só a sua imponente presença colorida pintando o céu já era por demais valioso pra mim.

O crepúsculo, com cores vibrantes, anunciavam uma noite azulada, muitas vezes ofuscadas pelas luzes da rua, que não me deixavam ver nitidamente os corpos celestes deste teto de azeviche, testemunho silencioso do aconchego de mais uma tranquila noite de sono.

Ah! Lembro-me de um cruzeiro do sul indicando as direções aos corações perdidos, das três Marias sempre juntinhas numa cumplicidade sem par, como também da senhora lua, companheira de meus devaneios. Todos cumprindo religiosamente o seu ritual noturno na abóbada celeste das minhas lembranças pueris.

Nas noites frias de junho, o firmamento se enchia de pontos luminosos, os balões de São João, maléficos quando caiam, mas enquanto no ar se confundiam com os verdadeiros astros da noite, as constelações.

Com a luz do dia, admirava às pipas, quadrados, barriletes, que ornamentavam e coloriam o horizonte num contraste ao fundo azul que servia de moldura.

Eu sempre achei incrível os aviões rasgando o anil sem fim, sempre firmes nas suas rotas e propósitos. E eu, admirada, sempre os acompanhava com o olhar até os perder de vista, sem saber para onde iam, ou de onde vinham, e que um dia estes me levariam para tão longe daquele meu pedacinho de céu, que espiava ali do meu pequeno quintal.

O fascinante céu da minha infância era, de certa forma diferente mais ingênuo e simples, cheio de esperança. Hoje, sinto falta daquele céu, tão longe no tempo, mas sempre espreitado por um olhar fantasioso da menina que fui.