Bodas de Platina

Amar é sorrir por nada e ficar triste sem motivos,

é sentir-se só no meio da multidão,

é o ciúme sem sentido,

é ser feliz de verdade

Albert Camus

A relação de ambos estava no cume de um estouro. Qualquer coisa era motivo para gritos e discussões. Cada vez mais os conflitos aumentavam, algumas vezes ocorriam de duas a três vezes por semana, horas e horas de gritos e discussões, que ao final cessavam-se em prantos e lamentações, os quais como bêbados após um bom trago se entregavam a atenuar a própria culpa cingindo-se em um ato de perdão.

Apesar desta complicada convivência, baseavam-se na fidelidade e autenticidade entre ambos. Porém algo muito estranho começou a ocorrer, todas as discussões que de início pareciam ser de praxe diminuíram. O homem chegava e nada contrariava como era de seu hábito até então.

Sua esposa começou a desconfiar da quietude do marido, algo havia de errado, será que estava sendo traída? O homem não parecia mais o mesmo, decidiu ficar atenta, esperou-o dormir e começou a mexer na carteira e nas pastas dele, algo da suposta sirigaita devia estar lá para evidenciar o ato pérfido.

Em uma das folhas da agenda, a foto de uma moça, a qual era belíssima, na flor da idade, com longos cabelos cor de ébano e olhos azuis intensos, uma moça que faria qualquer homem perder a cabeça. A mulher sentia-se como Nacib ao descobrir a traição de Gabriela, ou como Otelo ao suspeitar da infidelidade de Desdemôda, o inconformismo com a traição era tanto que não queria nem mais olhar na cara do salafrário. Sentia-se personagem de Shakespeare e Jorge Amado ao mesmo tempo, os quais apesar de épocas diferentes abordavam com extrema versatibilidade este assunto ainda presente no cotidiano.

Sua decepção fora imensurável, todo aquele amor era sucumbido pelo ciúme, mas ela queria outra prova para confirmar tudo aquilo, aguardou uns dias e começou a verificar manchas vermelhas no colarinho das blusas do amado, sua decepção aumentava cada vez mais, fazendo com que lágrimas jorrassem de vossos olhos. Após tais provas estava inegável a traição, teriam uma conversa séria, a qual poderia ser a última discussão de ambos. A mulher estava decida a dar um basta na situação.

O marido chegou e não fora recebido com o costumeiro beijo da esposa, ela o aguardava no sofá, pronta para selarem tudo isso e colocar um fim nesta história. Ela estava com uma cara de desconfiança e séria para o marido, o qual corou e indignou-se pela esposa ter descoberto tudo, colocava a mão no bolso traseiro a fim de explicar a situação,quando foi interrompido pela montanha de palavras que ela despejava.

A foto fora levantada e as camisas beijadas expostas. O homem olhava tudo com surpresa. A esposa com mais, da cara de pau do acusado:

- Você olhou bem a foto?- dizia ele

- Olhei!

- Pois então?

- Pois então o que?

- Não se reconheces aos vinte anos quando nos encontramos pela primeira vez.

A mulher pegou a fotografia, olhou fixamente e notou os traços semelhantes. Essa ele conseguira responder, mas como se explicam as manchas de batom no colarinho.

- E as manchas do colarinho? Não reconheces o próprio batom? O qual toda vez que adentro esta casa me recebes com um beijo nos lábios e outro próximo a região do pescoço.

A mulher passou o dedo nos lábios viu a cor, comparou com os das blusas e emudeceu. O que faltava se explicar era o porquê ele ficara tão corado quando ela iria introduzir o assunto além do cessar das constantes discussões.

- Simplesmente por isso- o homem colocou a mão no bolso e retira duas passagens para Buenos Aires- Aqui está nosso presente de 20 anos de casamento.

Não só a esposa, mas o marido estava revendo conceitos, tudo fora planejado, queria descobrir até que ponto sua esposa o amava, ou estava atrelada a ele apenas pela instituição matrimonial.

Ambos se beijaram e esqueceram os conflitos anteriores, focando-se apenas no amor.

As grossas e pesadas cortinas fecharam-se, e os aplausos ecoaram pelo grande Teatro.

Moral: Muitas vezes o ciúme faz com que o homem vende-se para os verdadeiros sentimentos como o amor. Fazendo enxergar situações incabíveis onde não existe. Discussões podem ser encaradas como sinônimo do amor, pois discutir é o ato de se importar com o outro, o cessar destas é que se é para preocupar!

Vinícius Bernardes
Enviado por Vinícius Bernardes em 14/04/2012
Reeditado em 14/04/2012
Código do texto: T3613031
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