Retrato em preto e branco

Sempre questionei os programas de renda mínima. Nunca achei que a solução de nossas mazelas fossem esses programas, que ao invés de erradicar a miséria, trazem é mais dependência para a classe de miseráveis que infelizmente ainda existe.

Essa visão assistencialista de nosso governo já deveria ter sido ultrapassada e substituída por projetos, que ao invés de segregar, deveriam incluir nossos pobres em programas de geração de emprego. Qualquer ser humano se sente mais digno e valorizado quando é capaz de prover o seu próprio sustento. Ter que passar pelo constrangimento de enfrentar filas para provar sua condição de pobreza e conquistar um cartão passaporte de miserável não eleva a autoestima de ninguém, pelo contrário, estraçalha a dignidade de quem tem que se declarar dependente de ajuda para conseguir comida, vale-gás para cozinhar essa comida, bolsa escola para evitar que seus filhos fujam da escola para trazer comida para casa e outras bolsas e vales mais.

Sei que é impossível para qualquer governo evitar o quadro social que demorou séculos para ser pintado do jeito que está: uma obra de arte surrealista mesclada de um impressionismo mórbido, que chega a dar vergonha para quem procura a profundidade do sentido. Mas é um quadro em preto e branco com imagens bem chocantes, a arte de descompromisso dos governantes com projetos sociais sérios.

E enquanto não houver investimento nas áreas de micro e pequenas empresas para a geração de empregos e redução dessa carga tributária gigantesca que carregamos, a fábrica de desempregados vai continuar sua produção em massa e o comércio vai continuar falido. Não existe comércio que sobreviva em sociedade onde o dinheiro não corre.

Vejam o exemplo de nossa cidade: apesar das poucas indústrias, ainda tem o privilégio desse comércio informal das rifas que aquece a economia do município e mesmo assim ainda é visível a retração do mercado. Basta observar quantas salas comerciais estão de portas fechadas no nosso centro comercial. Isso é reflexo da situação estagnada do nosso crescimento econômico. É fácil calcular em números de empregos quanta gente fica à margem do processo e é empurrada para a informalidade, porque a população não para de crescer, enquanto a oferta de empregos só diminui.

Juntando-se aos jovens sem experiência batalhando pelo primeiro emprego ainda temos os que são excluídos pela idade e perversamente considerados ultrapassados para exercer atividades trabalhistas. Diante da falta de expectativa, o que resta para os mais humildes e conformados é viver em silêncio as privações que a miséria oferece, dependendo cada vez mais de esmolas para sobreviver.

Infelizmente, para muitos de nossos governantes a política ainda data da época dos "pais dos pobres". Ainda não acordaram para buscar soluções que acabem com o paternalismo e busquem alternativas que permitam que eles façam parte da construção do nosso país, com salários dignos, com a cabeça erguida, com os olhos brilhando com a esperança e a certeza do pão de cada dia. É preciso dar-lhes a chance de descobrir que eles fazem parte desse processo de construção porque eles podem manejar a pá, basta que lhes seja permitido fazer parte do canteiro de obras. Apesar de entender pouco ou quase nada de engenharia, sei que toda construção se inicia pela base e é nela que se fortalece a edificação. E a base da nossa nação são os pequenos municípios, que se bem administrados, podem servir de exemplo para os grandes que estão aí, decretando falência administrativa em muitas áreas.

Se nossos governantes não são salvadores da pátria, que possam pelo menos ser os defensores da dignidade de sua gente, mostrando o orgulho daqueles que trabalham e nunca o retrato de um povo vencido, dependendo de esmolas para sobreviver. Já é tempo desse país apostar no trabalho e não na inércia de nosso povo.

maria do rosario bessas
Enviado por maria do rosario bessas em 16/04/2012
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