PACIENTE

Assim como cliente, relativo a comprador, e usuário que tem significado mais abrangente, paciente também tem sua designação própria. No dicionário do Aurélio, paciente é aquela pessoa que está sob os cuidados médicos. Em outro, paciente é aquela pessoa que consulta um médico ou um profissional da área de saúde. Encontrei também que paciente significa: aquele que tem paciência. É com base nesta última definição que estou escrevendo.

Sou deficiente visual e por conta desta condição visito constantemente clinicas e hospitais públicos e privados. Nestas andanças observei fatos que me chamaram a atenção que tentarei descrevê-las aqui. Não vou discutir mobilidade urbana em sua totalidade, mas com certeza vou abordá-la, assim como a acessibilidade.

As calçadas no entorno destes postos de atendimento de saúde têm, em sua maioria, as maiores dificuldade de locomoção para os pacientes. Aí começa a designação correta da palavra paciente.

Nós, pacientes dos atendimentos de saúde, precisamos de muita paciência para transitar entre os postes de iluminação pública, postes de regulamentação de estacionamento, postes de placas de identificação das ruas sem as devidas adequações para pessoas com deficiências visuais, de árvores cujas raízes quebram as calçadas e assim permanecem por muito tempo. Os orelhões telefônicos, quase sem uso e, principalmente, sem sinalização de solo (piso tátil) provocam trombadas e cabeçadas constantemente. As árvores também devem receber a mesma sinalização de solo. Há outros entraves como bancas de revistas, de roupas usadas e bancas que vedem de tudo, desde guloseimas até frutas que ficam expostas ao sol e a fuligem dos veículos. Além, é claro, das panfletagens de movimento grevista até plano de saúde.

Faltam faixas de pedestres elevadas ao nível das calçadas que funcionam como lombadas (conhecidas como lomba-faixa) que facilitam a travessia das ruas de cadeirantes, obesos, idosos, pessoas com problemas de imobilidade temporária e de articulações. Ou ainda pode-se perceber a ausência de rampas de acesso.

Depois de superar todos estes transtornos no lado externo dos hospitais chega-se a área interna. Um alívio? Nem tanto. O calvário ainda não terminou. Há filas intermináveis para o atendimento tanto na recepção quanto nos guichês das especialidades onde as atendentes não têm a menor preocupação em se mostrar afável com seus pacientes. Paciência! É o que mais se ouve. Geralmente utiliza-se de duas salas, uma para recepção e outra para espera, onde é exercido o dom da paciência.

A mobilidade interna deixa muito a desejar, principalmente em clinicas instaladas em edificações antigas e não projetadas para esta finalidade. Há diferença de níveis entre os ambientes, escadas com corrimão inadequado e quinze degraus a serem galgados, com um deles fora dos padrões dos demais para ajustar-se a altura do pé direito do imóvel. Naqueles edifícios que existem elevadores também existem problemas. Os mesmos não atendem comando de voz e ou não há caracteres em Braille nem tão pouco o painel é acessível aos cadeirantes e anões.

Somos pacientes e paciente tem o dom de exercer a paciência para esperar o doutor se atrasar por conta do trânsito engarrafado, por uma cirurgia de urgência, por uma visita aos pacientes da UTI ou por causa de uma lesão muscular ao jogar golfe ou tênis no final de semana num country clube. Assim, pacientemente cada um vai contando a história de suas doenças e suas desavenças com o atendimento até ouvir alguém chamar seu nome.

Numa dessas contações de histórias eu também contei uma das muitas que aconteceram comigo. Em 2009, passando por uma consulta de glaucoma com o Dr. Aloísio, em um hospital público, o mesmo me orientou que eu deveria deixar meu olho morrer. Só retornei naquele hospital em março deste ano, dois anos e meio depois e, para meu desespero, lá estava ele, o mesmo médico. Durante este período passei por diversas clínicas particulares de renome e outro hospital público. Meu olho morreu é verdade, mas foi frustrante e deprimente ouvir do médico, naquela ocasião em que eu ainda via a luz, aquela orientação. Minha filha tentou retrucar, mas eu a acalmei. Mais uma vez exerci o dom da paciência e ser paciente.

Neste retorno ao Dr. Aloísio ele tentou questionar minha ausência por tanto tempo, mas antes mesmo que eu o retrucasse se calou. Penso que ele lembrou-se de que havia determinado a morte de meu olho. Solicitou um exame de retinografia pelo qual eu passei e pediu que marcasse retorno para após o resultado do exame. Na segunda consulta deste ano, em 18/04 – o retorno, ele faltou e, assim como eu os demais pacientes do Dr. Aloísio fomos encaminhados para outro médico, o Dr. Daniel, mas este simplesmente nos ignorou. Após aguardarmos no corredor por mais de meia hora sua entrada na sala de consulta, chamou um a um os pacientes do Dr. Aloísio e foi dispensando-os sem nem sequer se dar ao trabalho de avaliar a pressão ocular, análise fundamental para um glaucomatoso. Perguntei-lhe se era por isso que nos chamavam de paciente ele tranquilamente respondeu que sim.

paciente

(latim patiens, -entis)

adj. 2 g. s. 2 g.adj. 2 g. s. 2 g.

adj. 2 g. s. 2 g.

1. Que ou quem sofre sem reclamar. O mesmo que conformado, resignado, submisso; diferente de: inconformado, revoltado.

Poeta dos Mares
Enviado por Poeta dos Mares em 21/04/2012
Reeditado em 23/04/2012
Código do texto: T3625887
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.