Sobre o tédio


Um vazio. Nada preenche esse vazio que,  como um buraco negro, engole a vida. Esse é um tempo que deveria ser descontado.  Espere aí Senhor do Tempo, desconte este tempo do meu tempo! Não deveria valer de verdade, vida que não se vive. Sem vontade para o menor gesto. Um peso é o que é. Peso pesado. Nem as pálpebras arriscam um levantar. Tudo parado, o olho parado, lassas as mãos e as pernas. O pensamento é um cansaço só, impedido de sair, volteia como em um labirinto sem nada perceber. Procuro em vão jogos mentais que estimulem qualquer coisa. Mexa-se, eu digo, lábios fechados, ouvidos moucos. Tédio. Cinco letras, duas consoantes, três vogais, uma palavra, duas sílabas. Oidét. Oi Dét! Oidét, um belo nome para um filho de um relacionamento tedioso. Filho homem, o tédio é masculino.É também humano, já disse alguém antes de mim.  Tédio. Começa com T e termina com O. T de Tarcísio irmão que se foi e que certamente nunca soube o que era tédio. Para ele todos os dias eram domingos de festa. Termina com O, de Olímpia, a avó que nem conheci e de quem herdei o nome e as histórias para contar. O tédio é ruim. Remexo em busca de um movimento. Tudo parado, acomodado. Mas nem diferença iria fazer se o vento balançasse alguma coisa para lá ou para cá. Como essa rede.  Meu Deus, como este dia demora a passar. Se eu quisesse alguma coisa agora, eu ia querer que essa rede caísse no chão, comigo deitada nela, fazendo  barulho, acordando os cãezinhos que chegariam apressados, assustados. Talvez meu ânimo também acordasse e eu sentisse pelo menos a vontade de ir tomar um banho. Um banho de água bem gelada, uma água que levasse para bem longe esse meu torpor. Mas para o tédio só há um remédio – os dias de feira. Que cheguem logo todos eles, de segunda a sexta, abençoados pelo trabalho! Ah, se fosse possível escolher eu jogaria moedas para o alto até que a outra face do tédio caísse virada para cima. Se der cara passarei um dia em companhia do Tédio, se der coroa, será a vez do Entusiasmo. Se entusiasmo fosse uma erva eu plantaria todo um jardim de entusiasmo e dele faria sempre um revigorante chá.Aos domingos eu chamaria os amigos, os parentes e os vizinhos para tomarem comigo um chazinho de entusiasmo.E o dia certamente seria diferente e no fim dele eu diria:Nossa! Eu nem vi o dia passar.