Religiosos aterrorizantes - Como se permite?

Fruto da semente que semeei, graça divina, de Deus alcancei. Tenho um filho, uma bênção do Senhor para minha vida. Com esse sentimento inexplicável da paternidade, busco em Deus o modelo de um pai... que alimenta, que veste, que educa, que protege, que cuida, que ama.

E é com esse tratamento que luto até que se esgotem as forças, até que eu consiga realizar-me na prática do querer bem, uma vez que quem ama, cuida.

Sofro junto a minha esposa em ter que assistir o sofrimento do meu filho diante do terrorismo alimentado no seio da igreja. Não importa se é a Igreja de São Francisco, a Igreja de São Pedro, a Igreja de Santa Inês, a Igreja de Santa Luzia ou a Igreja das múltiplas Nossas Senhoras. Isso é notório e perceptível por qualquer "pessoa humana" que se permite um mínimo de sensatez e humanização.

Como pai e como pessoa humana, e mais, no exercício da minha cidadania e de um cristianismo autêntico, fico a dialogar com a Divindade: "Meu Deus, quantas crianças, quantos idosos, quantos acamados precisando de um pouco de paz e, neste momento, são submetidos à "guerra", ao "terrorismo", aos "explosivos" que acariciam a VAIDADE de tantos que se dizem cristãos em detrimento da saúde do sistema nervoso, psíquico, emocional e mental de um outro grupo de pessoas indefesas que carecem muito mais da nossa atenção, do nosso afeto, do nosso zelo, da nossa proteção".

Nas asas do vento, nas páginas dos jornais, na tela da TV, na oralidade da massa ou mesmo nas ondas navegatórias da internet, gostaria imensamente que esta crônica argumentativa alcançasse todas as lideranças políticas, todas as lideranças eclesiásticas, todas as lideranças da justiça da nossa nação e a toda pessoa humana, cidadã de um país chamado Brasil que prega a democracia sim, mas que não desfaz a hierarquia nem a ordem nacional, como também não permite, ao menos nos poucos registros legais sobre a questão, a exposição egoísta e envaidecida de alguém pretensioso em apresentar-se como o astro ou a estrela da manhã ou da noite em detrimento do sossego, da paz, da harmonia, da alegria e da saúde pública dos outros. O posicionamento dos representantes destes segmentos da nossa sociedade já é esperado por muita gente há muito tempo.

Vemos a todo instante as pessoas em busca por uma cultura de paz entre as nações, entre os Estados, entre as pessoas, mas não é possível acreditar numa cultura de paz conjugada a uma cultura de explosões, de fogos, de terrorismo. E como esta cultura também é vivenciada dentro da Igreja (digo assim por ser algo bem aflorado em alguns dos adeptos dela sem um mínimo de restrições), a situação se torna mais vexatória, muito mais.

O tema da popular Campanha da Fraternidade coordenada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) em 2012 é bem pertinente ao que trato aqui: "Fraternidade e Saúde Pública". É um tema muito complexo, e louvável é a sua iniciativa por abordar o tema, mas se nessa sua amplitude, a saúde do sistema nervoso, o equilíbrio psíquico, emocional e neurológico das pessoas não estiver dentro desse contexto, então já não sei mais o que define a expressão "saúde".

Não é minha intenção censurar a igreja (jamais), mas critico (a crítica é sempre construtiva) essa prática de alguns de seus membros dentro dela. O livro de Eclesiastes (Bíblia sagrada) define que vaidade é pecado e, nos Evangelhos, Jesus mostrou-nos que a simplicidade e a humildade são virtudes. Perceba-se, então, que já é tempo de não mais alimentar essa vaidade dos que, na pretensão de ser grande, aplaudido, o responsável pela noite mais bonita, ou coisa assim, lutam por querer ser visto como o "noitário" mais nobre do mês que dedicam à Maria - Maio. Se querem investir, façam-no! Mas há outras formas. Ofertem à igreja, invistam nas pastorais, percebendo, sobretudo, que em quaisquer circunstâncias ou situação, só Deus é Grande. Desse ato sim... certamente virá o retorno. Sabemos, é claro, que essa prática não se restringe apenas ao mês de maio, que é do costume de muitos essa prática diante de uma série eventual de comemorações: quando um time pelo qual se torce é vencedor de um determinado campeonato, quando alguém faz aniversário, quando se ganha uma eleição, etc, mas ainda assim, diante de quaisquer circunstâncias, todos se dizem cristãos, e isso parece incoerente à própria afirmação de religiosidade, uma vez que soltar fogos explosivos em nada combina com a prática cristã, uma vez que isso perturba e agride um grande número de pessoas, cabendo também à igreja, portanto, essa orientação.

Nesse ensejo, também me dirijo aos líderes políticos de todas as esferas do governo brasileiro. Não seria a hora de perceber o dever do Estado em cuidar da saúde pública nesse âmbito? E não é a prevenção ainda o método mais eficaz no combate às enfermidades (ou às suas causas) que assolam o ser humano? A lei já pune quem solta balões, e sabemos que essa também já foi uma prática ocorrida por muito tempo nas igrejas. Agora é hora de acabar também com essa forma de terrorismo. Não é só aquelas rebeliões que ocorrem nos morros do Rio de Janeiro ou de qualquer outro lugar que tem gerado consequências terríveis e muitas vezes irreversíveis. Essa prática também deixa suas marcas. A plena 6h da manhã, meu filho é despertado sob os efeitos dessa "guerra" e até às 21h da noite, quando ele outra vez começa a ceder para o sono da noite, a guerra, o terrorismo ainda continua. Basta imaginar como o pânico lhe toma nesse momento para compreender minha posição agora. Isso é revoltante, e não só em mim, tenho certeza, causa uma grande indignação.

Aos nossos advogados, aos nossos promotores de justiça e magistrados faço também o meu apelo em nome de todos esses indefesos. Certo estou de que todos gostariam que isso que agora faço já houvesse acontecido, e talvez alguém já o tenha feito, não sei. Sei apenas que é respaldado na própria Constituição Federal, em seu artigo 5º que manifesto esse pensamento. Nesse artigo mesmo, em seu inciso III, leio que "ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante". Será que apavorar uma criança não é torturá-la em sua inocência e dependência da proteção de alguém? Convido qualquer pessoa a enxergar um filho recém-nascido, uma criança em qualquer idade, um portador de doenças cardíacas, um idoso, às vezes já sem noção de algumas coisas, porém vivo e ainda reator aos efeitos do meio, ou um acamado, enfim, diante de uma situação dessas. Não é difícil assim compreender essa prática como tortura, como um tratamento desumano. Se a medicina, a psiquiatria, entre outras ciências do ramo forem mencionar, inclusive, os efeitos desse tratamento, não serão poucas as consequências que haverão de mencionar. Por isso, muito preocupante.

Nesse ensejo, busco também a atuação dos Conselhos Tutelares, pois em lei específica como o Estatuto da Criança e do Adolescente, o artigo 18 define que "é dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a SALVO de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor". E é com respaldo que quero salvar o meu filho e ajudar a salvar os filhos de tantas outras famílias que experimentaram e ainda experimentam essa violência, essa prática desumanizada.

Não sou portador de título político, eclesiástico ou jurídico. Sou apenas um cidadão brasileiro que no gozo de direitos civis e políticos sinto-me realizado em portar o título de pessoa humana.

Nas cartas paulinas (Bíblia Sagrada) foi registrada a seguinte ideia: "Tudo seja feito com decência e ordem". Perceba-se que o pronome aqui é indefinido e generaliza: TUDO. E essa ideia é uma filosofia muito pertinente para tudo, inclusive, para as relações sociais. Não nos permitamos perder a verdadeira essência da cultura de paz. Não é possível estar em paz assistindo o sofrimento de outrem. E como já foi dito por Santo Agostinho, "não há caminho para a paz; a paz é o caminho", e nessa perspectiva, precisamos promovê-la fazendo com que as pessoas se sintam melhor e mais feliz, como disse a Madre Teresa de Calcutá.

Ser cristão é olhar para o outro como se olha para si mesmo. Explosão de fogos não fará da noite a mais bonita. Ela é linda por si mesma. É obra do Criador. Nem tampouco fará de alguém o mais religioso, o mais importante da comunidade. Ao contrário, fará desbotar o humano da pessoa que se poderia ser.

Julgo que se Cristo em todo seu esplendor e glória fez-se 100% HOMEM provando-nos que é possível uma vida virtuosa sob a humanização, eu diria que ser cristão é ser muito mais HUMANO.

REFERÊNCIAS

BÍBLIA DE ESTUDO PENTECOSTAL. ed. rev. corrig. Rio de Janeiro: CPAD, 2008.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Diário Oficial da União, DF, 1988.

_____. Lei 8.069 de 13 de julho de 1990: estatuto da criança e do adolescente. Diário Oficial da União, DF, 1990.

NUTTI, Juliana Zantut. Distúrbios, transtornos, dificuldades e problemas de aprendizagem. In <http://www.psicopedagogia.com.br>. Acesso em 14 ago. 2010.

REVISTA CONSTRUIR NOTÍCIAS. Saúde e doença: dois lados da mesma realidade. Construir Notícias, Recife, ano 11, n. 62, p. 12-19, jan/fev. 2012.

TELES, Maria Luiza Silveira. Psicodinâmica do desenvolvimento humano: uma introdução à psicologia da educação. 9. ed. Petrópolis: Vozes, 2001.

Prof Emilson Martiniano
Enviado por Prof Emilson Martiniano em 03/05/2012
Reeditado em 09/09/2016
Código do texto: T3647686
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