Conto de ninar.
– Papai, conte-me uma história de horror?
– Filhinha, não é melhor um conto de fadas? Você precisa dormir…
– Não! Quero uma história de horror! Já sou grandinha, papaizinho, pode contar-me.
– Há algumas noites atrás fizeste-me o mesmo pedido e…
– Papai! Eu mudei, já cresci algumas noites – desde àquela até agora – e digo que estou pronta. Conte-me, por favor?
– Está bem, meu anjinho, vamos lá: “era uma vez uma casinha feia, no meio de um terreno mal cuidado, escuro, cheio de árvores secas e galhos velhos. Um dia, por entre uma das telhas quebradas, surgiu um olhar a assistir o sono da menina que morava na casa. Desceu, este olhar, ardilosamente por entre o madeiramento, que mal sustentava a si próprio, e lançou, silenciosamente, a mão de encontro a menina. Então…”
– Pare! Pare! Por favor, papaizinho, pare!
– O que foi, meu bem?
– Essa historinha é muito feia – respondeu a menininha com os olhos num represar de lágrimas.
– Mas você me pediu…
– Eu sei, papai, me desculpe. Agora conte-me aquela da princesa?
Contrariado, o pai olha duramente a filhinha que, ao ver o gesto de descontentamento do pai, traz o cobertor ao rosto e transforma-se num desenhado de olhos e sobrancelhas apenas. Um meio semblantezinho doce, mas muito sabido. Comovido, torna o pai para outro livro, abre um sorriso e trata de quebrar, dolorosamente, a canteira que cobriu-lhe o coração. Lê alto o título:
– ”A princesa no castelo do tempo”.