E não me papariquem

Wilfredo Eberhardt, meu eterno sogro/pai/companheiro, ficava injuriado ao ler nos jornais que com o “idoso” aconteceu isso ou aquilo. “Idoso” era uma identificação que usavam para quem tinha mais de 50, assim como, hoje, usam “aposentado” como profissão.

Medicina, acesso a informações etc. empurraram o limite mais para frente: passou a ser 60 e até 65, mas um dia chega, e as coisas começam a mudar. Às vezes sutilmente, às vezes de supetão, deixa-se de ser capaz para transformar-se em frágil cristal que quebra a qualquer toque. Nosso cérebro deixa de raciocinar, nossa vontade deixa de ser levada em conta, nossos gostos passam a ser determinados por outros, nossas aspirações são levadas pelo vento nossa sede de descobertas é tratada como devaneio senil.

Não é com quem envelhece que essas coisas acontecem, mas com quem cerca os “velhos” e acha que amor, carinho, cuidado, são diretamente proporcionais à superproteção, desrespeito à liberdade e infantilização impostas às pessoas com mais idade. Servem-lhes sempre a mesma comida, pois “é o que gostam”; levam sempre aos mesmos lugares porque “lá se sentem bem”; nunca discordam deles “por uma questão de respeito”; não propõe programas diferentes porque “não vão gostar e preferem ficar em casa”; em suma, equivocadamente, decidem impor-lhes uma vida sem brilho, sem aventura, sem desafios, à espera do próprio velório.

Daqui a uns dias chego oficialmente lá e vou tomar a vacina contra gripe. Mas é só. Não estacionarei em vagas para idosos, mas continuarei a brigar com as professorinhas jovenzinhas que o fazem, e não entrarei em filas preferenciais com uma pilha de boletos na mão, mas continuarei a olhar torto para os velhos que se submetem a isso e aos pais que só levam filhos no colo para ir ao banco. Não é frescura, é agradecimento por ainda não precisar disso. Tomara que nunca precise.

Mas é bom avisar a quem me cerca ou cercará: continuarei a andar de bicicleta por puro prazer, ler de tudo, discutir, rir pelo gosto de rir, procurar novas receitas e inventar outras, ter sede de aventura, de descoberta, gostar de estar com jovens para beber de seu entusiasmo e de idosos para absorver sua sabedoria. Viverei, portanto, como sempre vivi, até descobrir que foi a melhor coisa que fiz. E não me papariquem!