TESTAMENTO (O que fazer em casos de escândalos como o do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte)

No domingo, dia 13 de maio de 2012, todos os espectadores que estavam vendo o Fantástico, assistiram com estupefação à reportagem sobre o escândalo do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte.

Para você que estava sintonizado em outro canal, tinha ido à missa ou ao culto, não lê jornais e/ou revistas, não tem hábito de assistir a noticiários, ou está lendo essa crônica por puro acaso; eu apresento, a seguir, um breve resumo da notícia.

A reportagem começou mostrando rolos de papel higiênico decorados com notas de dólares ou euros, encontrados na residência do casal George Leal, empresário, e Carla Ubarana Leal, funcionária de carreira, de alto nível do Tribunal de Justiça potiguar. Pensei ser uma tolice, já que eu também tenho papéis e guardanapos similares, comprados por mixaria em lojas U$1,00 Tree dos Estados Unidos.

O que se seguiu, contudo, foi completamente inusitado, até mesmo para nós, capixabas, que já tivemos o desprazer de ver nacionalmente expostas, durante a Operação Naufrágio em 2009, as vísceras putrefatas de alguns juízes e desembargadores, que vendiam sentenças.

Com imagens provavelmente feitas pela polícia federal, viu-se o rosto da tal Carla, relatando como que ela e dois desembargadores se apropriaram, indevidamente, de R$ 20 milhões: formada em direito, administração e economia, ela foi convidada pelo então presidente, Osvaldo Cruz, para cuidar do setor de precatórios, e descobrira que havia muito dinheiro parado e/ou não reclamado pelos credores.

Segundo essa “santa mulher”, ao comunicar tal fato ao desembargador-mor, ouvira dele um pedido para fazer a grana “sem dono” “trabalhar” em favor de ambos. Como bastam canetadas de autoridades do judiciário para que todos as cumpram (se borrando de medo), despachos simples foram feitos e a dinheirama mudou de contas e de mãos rapidamente.

Com a substituição do desembargador Osvaldo Cruz por Rafael Godeiro, a partilha passou a ter três como divisor, mas ainda assim, houve grana suficiente para o casal Leal torrar comprando seis automóveis de luxo, totalizando um milhão de reais (um deles é um Mercedes Benz que custa a bagatela de R$650,000,00); uma mansão na praia (dois mil metros de grama e piscina olímpica com água aquecida), no valor de R$ 3 milhões; dois terrenos; duas casas; um apartamento; dois celulares importados (iguais ao da Madonna e de David Beckham, por R$33.000,00); e muitos passeios por esse mundão de meu Deus, chegando a pagar diárias de R11mil euros, como no Plaza Athenée em Paris.

Como “o capeta ensina a fazer a panela, mas não ensina a fazer a tampa”, o Ministério Público Federal investigou o caso e hoje Carla e George Leal cumprem prisão domiciliar (Gostoso, não é?), talvez por força de alguma proposta de delação premiada, ou nós não tomaríamos conhecimento desse fato . Os outros dois ladrões, os desembargadores, estão livres e mesmo que não sofram nenhuma punição exemplar (o corporativismo costuma proteger os seus iguais), já estão pagando o preço da vergonha imposta a todos os seus familiares.

Durante todo o tempo em que assisti à reportagem, eu me lembrei de que já escrevi sobre esse tema na crônica: “Precatórios: envelhecer, adoecer ou morrer”, aqui publicada em fevereiro de 2011. Nela eu informei que esses são papéis a que têm direitos todos os “bichinhos de orelhas” que comeram o pão que o diabo amassou com o rabo sujo, quando o Governo do Estado do Espírito Santo, na década de 80, deixou de cumprir a Lei da Trimestralidade, que “corrigia” a defasagem salarial originada por uma inflação perversa que assolava o País.

Na época, os credores, isoladamente ou organizados por seus sindicatos, entraram com ações na justiça, que foram contestadas em várias esferas até que se chegasse à Cepres- Central de Conciliação de Precatórios-, setor criado pelo Tribunal de Justiça do Espírito Santo, por meio da Resolução n° 24, de 21 de setembro de 2009 (D.J. 24/09/09), para agilizar a tramitação de processos referentes a precatórios.

Descobri, então, em http://www.tj.es.gov.br/cfmx/portal/Novo/conteudo.cfm?conteudo=5194, que existem “Critérios para Pagamento de Créditos Prioritários” e modelos de formulário para requisições especiais para os portadores de doenças graves, mas como graças a Deus eu não sou portadora de a) tuberculose ativa; b) alienação mental; c) neoplasia maligna; d) cegueira; e) esclerose múltipla; f) hanseníase; g) paralisia irreversível e incapacitante; h) cardiopatia grave; i) doença de Parkinson; j) espondiloartrose anquilosante; l) nefropatia grave; m) estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante); n) contaminação por radiação o) síndrome da deficiência imunológica adquirida (AIDS); e/ou p) hepatopatia grave; eu, como diria Raul Seixas, “continuo com a boca cheia de moscas esperando a morte chegar.”

Não sei se um dia eu verei a cor desse dinheiro, aliás, nem sei se ele ainda existe, pois não creio que as Carlas Ubaranas Leais da vida sejam “privilégios” potiguares. Isso significa dizer que, a exemplo de muitos colegas do magistério que já “partiram” sem receber seus direitos, o mesmo pode acontecer comigo. Então, quero anunciar a todos que me impediram, até hoje, de usufruir de algo que podia ter me feito mais feliz, que nesta crônica fica exposta uma cláusula de meu testamento, que não pode ser descumprida:

Cláusula 1ª: Peço que meus descendentes investiguem qual era o valor de meus precatórios, vendam parte de tudo o que eu consegui ralando dia e noite, e contratem alguém como o Anderson Silva para dar uma surra bem dada em todos que deveriam ser exemplo de decência, honestidade e justiça, mas o são de “filhosdaputagem”.

NORMA ASTRÉA
Enviado por NORMA ASTRÉA em 18/05/2012
Código do texto: T3674415
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