Os deuses salvadores

O Século XX recebeu uma Europa que era uma colcha de retalhos de países, economias, crenças políticas e religioso-étnicas, se é que a expressão existe, com uma crença comum: quanto mais território, mais poder. Depois do sofrimento de duas guerras sanguinárias, pareceu aprender a lição, apesar dos conflitos étnicos e religiosos que sobreviveram para mostrar a bestialidade humana.

Esforços imensos foram necessários para a criação da União Europeia, isso depois da queda de ícones da intolerância, como o Muro de Berlim e a própria União Soviética opressora. O Século XXI recebeu um continente aparentemente mais cordato, justo e feliz. Foi infinito enquanto durou: a crise econômica que assola vários países acordou a intranquilidade adormecida durante décadas de ilusão de harmonia, e o medo voltou a morar nos monumentos.

Em algumas antigas peças de teatro gregas as tramas formavam tal emaranhado que soluções lógicas e naturais das histórias se tornavam quase impossíveis; nessas horas um deus era baixado ao palco, normalmente pelo uso de um artefato (máquina) e esse personagem, usando seus poderes, resolvia as pendências das peças de forma artificial.

Chamado de “Deus vindo da máquina” pelos gregos, foi apelidado de “Deus ex-machina” pelos romanos. Nos tempos modernos, alguém escreveu: “A guerra é o deus ex-machina do capitalismo”, pois nenhum acontecimento mexe tanto na economia e na cabeça das pessoas quanto uma guerra. Como o deus do teatro grego, ela resolve a situação de forma artificial e beneficia muito mais os mal intencionados do que os justos.

A crise europeia já começou a despertar esses deuses, por enquanto com o nome de partidos políticos, ressuscitando ideologias que julgávamos enterradas. A aparente desgraça econômica alimenta a crença de que soluções radicais, vindas de extremistas, são as únicas soluções. E a suástica recomeça sua dança.

Para completar o quadro, em todos os países em que o islamismo é majoritário, há partidos políticos que defendem a presença ostensiva da religião nos assuntos de Estado.

Será que estamos no caminho de uma tragédia grega muito mal escrita?