Tapetes: Casa Cor e Corpus Christi

Neste frio e chuvoso feriado de Corpus Christi resolvi visitar a Casa Cor Paraná em Curitiba. No caminho passei pela Avenida Cândido de Abreu e me surpreendi com o asfalto todo forrado pelo tapete típico do dia de Corpus Christi. Há muito tempo deixei de lado rituais cristãos que, no entanto, de um jeito ou de outro, fizeram parte de minha infância. Mas, ao avistar o tapete na avenida uma grande nostalgia tomou conta de mim. Lembrei-me de uma remota madrugada gelada em que acordei ansiosa para a execução final de uma tarefa que eu e colegas do Colégio Mãe do Divino Amor em Arapongas preparávamos. Havíamos passado dias observando desenhos, tingindo sal grosso com anilina, recebendo doações de pó de serra, e recortando em papelão os desenhos a serem aplicados no chão. Tudo seria avaliado e receberíamos notas em arte-desenho, era assim denominada a disciplina. Cabia a nós a execução do tapete em um quarteirão, o que não era pouco. Os demais quarteirões da Avenida Arapongas ficariam a cargo de outros alunos do Colégio das Irmãs (como era conhecido o Mãe do Divino Amor) e também aos do La Salles, à época só frequentado por meninos, e era onde meu irmão estudava. Não me lembro de meu irmão acordando de madrugada naquele dia...

Ao passar pela Cândido de Abreu, hoje, senti a brisa gelada que me encheu de entusiasmo décadas atrás. Quanto vigor colocamos no tapete daquele quarteirão da Avenida Arapongas: primeiro contornar o papelão previamente recortado para cravar o desenho no asfalto, depois, aos poucos, espalhar sobre os desenhos o sal grosso tingido e o pó de serra, sempre atentas à cor designada a cada espaço, observando o modelo com os desenhos pintados anteriormente.

Por sorte havia guarda de trânsito na Cândido de Abreu solicitando um pequeno desvio dos motoristas, a avenida não estava de todo bloqueada. Assim pude passar devagar, observar, relembrar a menina que um dia decorou uma avenida para o Corpus Christi no interior do Paraná e imaginar quem teria feito os tapetes de agora na avenida de Curitiba. Mas a menina hoje estava indo visitar a Casa Cor Paraná. Então no momento da passagem a lembrança foi fugaz.

Cheguei à Casa Cor e me deparei com outros tapetes. Tapetes que propunham ambientes também remotos porque parecem habitar somente a fantasia de poucos. Ali pude observar pessoas famintas por copiar idéias para seus projetos habitacionais. Projetos, por vezes, nada afeitos à habitação de pessoas reais, nada funcionais, para usar o termo ali empregado quando algo era para ser usado “de verdade”. Veio-me a imagem de um desfile de moda, algumas roupas são feitas mesmo para vestir, outras só para ver.

Por fim voltei para casa com três propostas: forrar de rolhas um pedaço qualquer de minha parede, me aquecer com uma lareira a álcool, e pisar em um tapete feito de lembranças de infância.

Rocio Novaes 07/06/2012