Queria ser um pássaro

Fiquei observando um pássaro no céu. Que magnitude, que liberdade suas asas indomáveis possuem. Quanto ele pode esquecer seus dilemas para apreciar o prazer do vento em suas penas. Como é fácil ser um pássaro. Quão difícil é ser humano. Observando as acrobacias da ave, senti um gostinho de liberdade também. Fechei meus olhos e voei com ela. Tão livre do cotidiano, das responsabilidades e dos problemas. Livre da opressão pecaminosa da sociedade. Livre de mim mesma. Que inveja senti dela.

Andamos todos às escuras, feitos ratos bêbados em busca do que nem imaginamos. Ousamos voar com asas mecânicas e nos prendemos dentro de nossa própria soberba. O céu é o limite, afirmamos. E, no entanto, não levitamos nossa imaginação por algo julgado impossível. Como somos hipócritas. E pequenos.

Ontem meu filho disse que não quer ser rico. Que se ele enriquecesse, gastaria sua fortuna construindo coisas que os homens julgariam serem besteiras. Isso me chocou profundamente. Porque imaginei ser uma mãe tão “pra frente”, tão sonhadora, que meu filho também o seria. E o que percebo? Que aos 11 anos ele começou a podar suas próprias asas. É claro que tem uma construção por trás disso. Ele não chegou a essa opinião do nada. Mas ele não queria mais voar. Conversamos muito. E citei todo o meu repertório de homens e mulheres incríveis que sonharam com o impossível. E que fizeram acontecer. Um brilho brando voltou aos seus olhos. Quem sabe as penas de suas asas voltaram a crescer.

Quantos de nós matamos nossas aves interiores? Tentamos voar e fomos derrubados... São tantos os estilingues...

É muito triste quando observamos tantos pássaros magníficos que não voam. São aerodinâmicos, possuem envergadura para suportar as correntes de vento. E não tentam. Conformam-se com o caminhar pacato de gado manso. Sabem que os gatos dos vizinhos espreitam seus movimentos e os temem. E mais nada. Esperam o fim que acontecerá com o pulo certeiro do inimigo. E gorjeiam arrogantes que “Deus quis assim.” Pobres avestruzes. Tanta elegância, tanta força e um estômago capaz de digerir as pedras da maldade. E timidamente caminhante. Medrosos a ponto de enfiarem as cabeças num buraco na primeira dificuldade. Mas as asas do avestruz não permitem que ele voe. Verdade. Mas abelhas também não deveriam voar. Suas asas são pequeninas e frágeis se comparadas com seu corpo pesado. E elas voam. Não tão belas como outros insetos, enfrentando dificuldades, mas voam. Não tanto quanto gostariam, mas voam...

Queria ser um pássaro. Qualquer pássaro. Desde que tivesse asas capazes de me elevarem aos céus. Qualquer pássaro que não temesse voar. E quando a vida parecesse pesada, sem rumos nem direção, abriria minhas asas e voaria livre. Sentiria o gosto do vento e esqueceria o amargor da vida. Quanta liberdade há na imaginação.