Escusas discretas

É impressionante como o ridículo pode atinar tanto ao sucesso quanto ao fracasso, consoante um futebolístico vira-casaca. Uma simples besta concepção, um impulso idiota, impensado ou pensado de mais, pode acarretar em consequências irreversíveis; interpretações impermanentes, porém impressões inalteráveis.

Há o ridículo bem pensado, articulado, um exagero cômico ou uma ousadia calculada, admirando-se assim a galhardia, coragem, cara de pau que muitos não possuem; há, no entanto, o ridículo impensado ou pior: mal pensado. Esse idiota é o que transpõe a vergonha alheia, que causa aperto no estômago, vontade de deglutir os grotescos descartes de um esfíncter bovino, aquele ridículo que causa amofinação.

Maldito malfeitor, o ridículo pessimamente feito, o qual se vê que não há conserto, conforme um vaso mal manufaturado o qual não se repara e ainda destrói a beleza das flores que carrega em seu interior. Fui vítima desse, num crime instantâneo com efeitos permanentes e até hoje estou aqui às 23:23, remediando com o veneno; executando a ação, injusta ou justamente, que causara o infortúnio: dizendo. E não paro de me decepcionar com a pobreza das coisas que disse, dos emendados grosseiros, como sinapses mal conectadas, problema nos dendritos ou nos próprios axônios, nesse emaranhado ridículo difícil tanto de se sentir, como de se expor e ainda pior de se dizer. Tento inocentar meu ego com a incerteza do sentir propriamente, infundando a pobreza das palavras, por eu ter uma falsa percepção da realidade dos sentimentos. Torno-me escusável quando não sei ao certo o que sentia, e disse, visto que teria dito só por comunicar, um simples jogar pra fora, como fazemos com uma bala que nos enjoa.

Este discreto arremedado de letras visa mais que fonemas que soam bem, visa também uma excludente de culpabilidade, baseado num método de auto reconhecimento, admitindo e expondo as minhas mencionadas inconstâncias e ridicularizações que condena corpo e alma, expondo que meu emaranhado de concepções e sinapses é difícil de se sentir e mais ainda de tentar expor através do dizer, talvez em atitudes seja melhor, talvez se conseguisse reverter o irreversível ou expor os tais em ações eu conseguiria me fazer escusável ou voltar ao que era antes, mesmo no fundo sabendo que o antes não era. Talvez o que se tem a fazer quando o ridículo não se há conserto, como o vaso, é apenas quebrá-lo e arrumar um mais direito que não danifique a apreciação das flores.