A Jibóia

A Jibóia







- Mas é claro que eu acho uma porcaria comer um bezerro inteiro – exclamou a jibóia para o repórter – lógico que, para ele descer pela minha goela, tenho de triturá-lo.

- E... - vacilou o repórter – então você não gosta?

- Detesto – arrematou ela, com olhos fuzilantes – tem idéia do que vira aquilo? Um saco de ossos e sangue...blearghhh....sem contar o que ele me xinga, amaldiçoa, xinga meus antepassados, meus descendentes, xinga minha mãe, é horrível...

- Mas...por que você come? – tornou o repórter, falando baixinho.

- Porque depois – esclareceu a jibóia – me dá um tuim na cabeça e eu... ah...eu durmo. Durmo profundamente. Neste sono está a minha recompensa, você entende?

- Mais ou menos – respondeu o repórter – nós, humanos, prezamos hãâãã..., o paladar.

- Paladar... – grunhiu ela – então você acha que meu paladar consiste em engolir meia tonelada de miúdos, blearghhhh, você acha?

- Eu...

- Ah, pois é, você hesita. Oh... – fez ela em tom de falsete – eu adoraria que me servissem camarão com molho roquefort, lasanha ao sugo, uma omelete com tomates e ervas, humm, mas, quem faria isso por uma jibóia? Às vezes aparece um cientista e me dá uns ratinhos. Qual, sem comentários. Eu como por educação, o pobre homem acha que está fazendo um grande avanço para a ciência... Já te disse, engulo o bezerro porque, uns dez minutos depois de toda a operação minha cabeça sente um tuim e eu desmaio. Ah, isso vale a pena. Mesmo depois de ouvir aquele bicho me xingando.

- Do que ele te xinga?

- De vaca.


(Imagem: do filme The Jungle Book, Mogli, 1967 )
Bernard Gontier
Enviado por Bernard Gontier em 03/07/2012
Reeditado em 02/07/2021
Código do texto: T3758069
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