O som do silêncio

Pelo rádio Canoro ouve a música da sua vida. Ou seriam as músicas?! Afinal, por seus ouvidos, abertos ao mundo, não passam apenas as músicas de sua escolha. Em ondas curtas e nostálgicas surge o mais variado repertório. Músicas vêm e vão quando bem querem, tocando como um disco girado pela mão de algum maluco randômico e, não raro, de mau gosto. Alheias à sensibilidade do freguês, não há decreto de vontade que as façam silenciar antes de terem cumprido sua missão: lembra-lo de que somos feitos de som!

Como refrão, ou despertadas pela frase de algum desavisado, se imiscuíam sem piedade em seu dia e, às vezes, em sua semana... Surgiam e eram cantaroladas para dentro, com palavras ou com assobio, bombardeando sua mente.

Traquina, passou a anotar algumas. Admirava a discrição do Rei Roberto Carlos, mas não se incluía entre seus fãs. Isso não o impediu de assoviar “o nosso amor é puro e espero nunca acabar, por isso, meu bem, até juro!...”. Noutro dia, a italiana “Torneró”, de Santo California, em hum-hum-hum melódico do fundo do peito, como ave de bico invertido. Até cantiga de roda cantarolou: “Coqueiro, coqueiro tão alto que ninguém pode alcançar”. E aqui o trinado ia até atingir o tom mais alto que conseguia.

Pois não é que depois de vigiadas as canções sumiram?! Melhor assim. Agora, alheios ao som desafinado de carros velozes, gritos ensurdecidos de torcedores no campo de futebol, latido de cães sem dono, Canoro e seus amigos pássaros brincam de notas musicais nas pautas dos fios elétricos.