Casada por uma noite

Meu casamento com Fernando durou apenas uma noite, ou melhor, algumas horas. Separamos sem discussão, sem malquerenças. Nossa amizade já suplantou mais de quatro décadas. Na época, ele era solteiríssimo, recém-saído do seminário, onde entrara aos doze anos e, após terminar o curso de Filosofia, tomou a decisão de conhecer melhor o mundo. Saiu, gostou e, ao seminário não mais retornou a não ser para visitar os muitos amigos, frades franciscanos, que ali conquistou.

Eu já tinha dois filhinhos, mas esse não foi o motivo de nossa desunião.

A cerimônia foi realizada no sítio do casal Lourdinha/Waldemar e havia muitos convidados. Lembro-me da Glória com o Guimarães, da Efigênia com o Dr. Cury, da Maria José com o Januário, da Eliana com o Paulo, da Vitória com o Galdino, da Vicentina com o Luciano, do Dr. Clóvis com a esposa e outros mais que faziam parte de nosso grupo do Lions Clube Candidés.

O sítio, todo enfeitado, recebia os eufóricos convidados naquela linda noite que se realizaria o casamento do ano. Falhas técnicas não faltaram. Uma foi “imperdoável”: a falta de um fotógrafo. Podia até ser amador. Era só para registrar aquele ato tão sublime.

Chega o Promotor de Justiça, Dr. João Meira de Aguiar, que aguardávamos com ansiedade. Afinal, seria uma grande festa e esta ilustre pessoa, de grande projeção na sociedade divinopolitana, é que realizaria o enlace matrimonial.

Foi com uma grande timidez que respondi “sim” à solene pergunta:

- Você, Fernanda, aceita o Sr. Fernando como seu legítimo marido?

Todos sorriram, trocando olhares mais que suspeitos. Acho que, na hora, fiquei vermelhinha!

Ninguém contestou, como de praxe acontece nestas ocasiões, que sabia de alguma coisa que desabonasse aquele respeitável senhor. Preferiram confiar e calaram-se para sempre! De braços dados, proferimos os demais juramentos, que seríamos fiéis na alegria e na tristeza, na saúde e na doença...

Quando Dr. João Meira terminou seu pronunciamento, com voz solene, com algumas palavras de aconselhamento, os casais presentes se empolgaram e a festa ficou animada. Não faltaram os famosos foguetes e fogos pirotécnicos de Santo Antônio do Monte! Quitutes deliciosos foram servidos: caldo de feijão, de mandioca, de pinto, quentão, biscoitos escaldados, biscoitos de amendoim, pés-de-moleque, pipoca e até algodão-doce.

O forró começou a todo vapor, à volta da grande fogueira, com a cantoria de uma dupla sertaneja, depois da tradicional quadrilha, presidida pelo Tio Nelson, que era exigente na marcação. Dançamos até o raiar do dia. Aí, nosso casamento terminou com um simples boa-noite! Cada um seguiu para sua casa. Esta festa junina ficou na história do Lions.

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Hoje, Fernando e eu, somos bons amigos. Nossas mesas de trabalho ficam lado a lado. Nossas divergências profissionais são resolvidas sem atrito e sem malquerença. Nossos filhos também são amigos e trabalham na mesma empresa. Ele, sempre de bem com a vida, nos brinda, periodicamente, com o Vossa Senhoria que é destaque no Guinness Book, edição internacional, como o menor jornal do mundo, do qual ele é colaborador.

Dr. Fernando de Oliveira Teixeira, atualmente, é Presidente da Academia Divinopolitana de Letras.

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P.S.: Em nossa região estas festas juninas são tradicionais em junho ( e julho também!). Não pode faltar o casamento na roça ( que é uma trapalhada só) que arranca risadas dos participantes. Quase todos vão a caráter. Os homens com roupa remendada nos pontos mais estratégicos, com chapéu e cigarro de palha. As mulheres fazem vestidos de chita, com muitos babados. Colocam flores no cabelo e usam uma ridícula maquiagem. A alimentação é toda típica da época: canjica, quentão, batata doce assada e os caldos.

fernanda araujo
Enviado por fernanda araujo em 22/02/2007
Reeditado em 23/02/2007
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