Conselhos para o jovem talento

 
Estamos no fundo do poço...
 
Sou testemunha do fim do mundo, do mal-estar que avança seus ramos nocivos e doentios sobre o que ainda resta de puro nas pessoas.
 
O veneno tem um efeito rápido. Corrompe as almas desavisadas e mata tudo que há de valioso na terra das criações, de onde nada mais brota. Terra seca, sem vida e estéril.
 
Somos as plantas podres da horta infrutífera!
 
Vejo os dois lados da mesma moeda. Dois escritores. De um lado, um escritor medíocre patrocinou seu sucesso, fez amigos nas grandes editoras (Panelinha e troca de acordos). E vendeu a ilusão de que as pessoas gostam de seus livros...
 
O outro, escreve com a alma. É talentoso. Mas sem ter como patrocinar seu sucesso, depende do reconhecimento que nunca virá...
 
Este último veio me pedir conselhos. Queria saber como fazer para ser reconhecido, tal como eu consegui ser.
 
Fico me perguntando... que reconhecimento ele viu em mim? Sou apenas um marginal das letras; o que escrevo não vence concurso, não é bonito (apesar de a beleza ser capaz de vir das coisas mais feias), e frequentemente é imoral e sujo.
 
E que conselho posso dar a não ser a dura e cruel verdade?
 
Eu poderia dizer para ele acreditar, que dinheiro não é tudo, seu reconhecimento virá e ele será recompensado por suas grandes e preciosas criações. Que "quem acredita sempre alcança". Mas não sou hipócrita...
 
Você, meu caro amigo, não terá uma vida fácil. Irá sofrer. E sua chance de conseguir reconhecimento é quase nula.
 
Vivemos numa época onde pouco se lê o que tem qualidade, e muito se lê o que aparece constantemente nas mídias. Não tem como patrocinar suas divulgações, promoções e contratos com grandes editoras? - Então prepare-se para morrer de fome! O dinheiro é o que conta! Escreva uma porcaria e divulgue, publique com seu dinheiro nas grandes editoras, divulgue com seu dinheiro nos grandes veículos midiáticos, pois somente assim terá seu reconhecimento! E não precisa dar importância à qualidade (existem revisores) e, o que é melhor: agentes literários que respondem às entrevistas (dessa forma ninguém desconfia de sua falta de intelecto, muito menos de que você não é tão culto quanto seus livros!). Que absurdo! As obras que o representam conseguem ter mais cultura que você!!!
 
Isso porque vivemos numa época suja, pobre e mesquinha. Não importa o que você faz, mas sim o que você é. Se não é célebre, rico e famoso, então você não é nada!
 
As pessoas só dão importância para aquele escritor mesquinho que aparece na mídia. Ele é famoso e é isso o que importa. Não importa o que ele criou. Não! Isso não importa! As pessoas querem estar ao lado daquele cara famoso, daquele maldito cara que promove seus "amigos" com sua presença.
 
Vivemos numa época de interesses, e isso explica tudo. Essa é a razão devastadora que destrói nosso mundo: o jogo de interesses.
 
E você acha isso ruim?
 
Um profeta sombrio me disse que vai piorar...
 
Felizmente, a história se encarrega de valorizar e imortalizar escritores talentosos como você, e deixa no limbo do esquecimento esses escritores medíocres cujo reconhecimento dura apenas uma geração. Mas o ruim é que ainda veremos o tempo sombrio em que comprarão a História e toda a Literatura, para tornarem imortais os medíocres! E as crianças do futuro serão enganadas nas salas de aula tendo que aprender e ler a literatura mesquinha, vazia e sem qualidade de nossa época. Estamos cada vez mais fundo nesse poço!
 
Ninguém pensa em ninguém. Ninguém dá valor ao que tem valor.
 
As pessoas de nossa época são muito egoístas.
 
Ofereça apenas o que elas querem, porque ninguém se importa com o que você pode dar de enriquecimento mental. Ninguém hoje em dia quer sequer saber em pensar!
 
Perdoe-me o pessimismo, jovem talento! Mas que conselho você esperava de um escritor que ainda sente as feridas dessa guerra injusta? Todos os dias carrego um fardo que chamo de "convivência do meio". Como já dizia Gilberto Amado: "Se viver não é fácil, conviver é o diabo". E eu convivo com centenas, talvez milhares, de livros mesquinhos que me são empurrados como jóias por seus autores igualmente mesquinhos.
 
Apenas viva sua aventura literária consciente de que nossa época não pede por fé, mas sim por algo que não deixe essa fé morrer.

Se é para ter esperança, tenha-a sozinho e não a divida com ninguém. A história se encarregará de valorizar sua obra, sem que a mesma se suje com a lama brasileira da literatura.

Se ninguém o reconhece, faça como eu: o reconhecimento vem de dentro. Melhore primeiro a si mesmo, crie sua obra como se fosse um novo fenômeno da natureza e não espere por leitores - seja você seu próprio e único leitor! Dessa forma, não precisará provar, nunca, que tem talento.

Lembre-se: ninguém liga para o seu talento. As pessoas são muito egoístas, pois, quantas vezes não vemos um "fã" que nunca leu a obra de "seu ídolo"?


Triste realidade é esta em que vivemos em que são raros os leitores que procuramos. Mas, se pararmos para pensar, em épocas passadas muitos escritores morreram no esquecimento para, só bem mais tarde, serem descobertos e imortalizados.

Quem é você, meu caro jovem autor? Um escritor cujo talento é autêntico ou apenas mais um descartável entre tantos?
Sr Arcano
Enviado por Sr Arcano em 28/09/2012
Reeditado em 05/05/2014
Código do texto: T3905615
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