Vergonha de chorar

Prólogo

Inicio a explicação deste texto transcrevendo uma pergunta que me fizeram há muitos anos e que, na ocasião, Eu acreditava não saber responder. A adolescente (15 anos) e Eu estávamos em um velório. A maioria dos presentes usava óculos escuros.

De chofre a menina bonita, de olhos azuis-ferretes, perguntou-me fazendo um trejeito excelso na boca diminuta, ajeitando os cabelos longos para trás da orelha direita e arqueando a sobrancelha esquerda, exteriorizando sua dúvida em um cochicho quase inaudível:

“Tio Wilson, por que em um velório, em um enterro, de famosos ou simples as pessoas usam óculos escuros?” – Incontinênti respondi num sussurro e sem pensar: “Creio que algumas pessoas têm vergonha de chorar. Mas, não se deve ter vergonha de chorar.".

NÃO SE DEVE TER VERGONHA DE CHORAR

As lagrimas são um ótimo desabafo, lava a alma; é a exteriorização de sentimentos e emoções humanas. Eu não tenho vergonha de chorar. Não é errado demonstrar medo, saudade, amor, paixão. E se fosse errado chorar os médicos e assemelhados não nos batiam para “abrirmos” os pulmões na ocasião do nascimento. Eis o que li escrito por um poeta, provavelmente decepcionado, mas sincero e verdadeiro:

“Não tenha vergonha de chorar” – Publicado em 02 de agosto de 2010. – (Por Álvaro Alves de Faria).

“(...) É tamanha a descrença com o mundo e com quase todas as coisas – e isso também inclui o ser humano – que a gente acha que não vai se comover com mais nada. E não vai se comover com mais nada porque nada, absolutamente nada, merece qualquer sentimento. Ou quase nada. Este é um mundo sombrio. Não tenho muitas ilusões com relação a isto. O que vale é a competição. O que vale é um passar por cima do outro. O que vale é a lei do mais forte. O que vale é a mentira. O que vale é a falta de respeito pelo outro. O que vale é ser esperto. (...)”.

EU NÃO SOU ESPERTO E TAMPOUCO TENHO VERGONHA DE CHORAR

Provavelmente o notável poeta estava triste e decepcionado quando escreveu as palavras acima. Contudo, percebe-se o muito de verdade em suas palavras. Observamos que quanto mais alto é o nível socioeconômico de uma pessoa, maior e mais firme é o seu pudor em demonstrar sentimentos pertinentes ao ser humano. Isso não ocorre com os mais simples, os humildes, que por isso mesmo merecem ser exaltados.

Costumamos afirmar que o sorriso é inerente às pessoas felizes, mas isso não é um axioma. Se assim fosse os palhaços nunca sentiriam tristezas. Ao contrário, os excelentes palhaços mesmo quando estão tristes demonstram sobeja alegria. Eles choram com suas almas quando seus corpos conseguem exteriorizar e convencer a sinonímia de suas felizes e benquistas vocações.

Eu não tenho vergonha de chorar e não escondo os olhos quando verto minhas lágrimas, mas chorar em demasia até secarem-se as fontes desse manancial de sentimentos. Já seco e feito uma ameixa-passada, sentar-me-ei à sombra de meu espectro como a visão de um morto, de um espírito, com aparência fantasmagórica, ectoplasmática.

No abismoso sintomático de meu vazio saberei esperar o porvir de luz, ouvindo os cânticos dos que me antecederam na sublime viagem ao encontro dos que me ensinaram – meus pais – a chorar sem pejo do ridículo.

Para que minhas lágrimas pareçam insignificantes Eu choro diante de meu jardim florido, em meu bosque, diante das ondas do mar ou mesmo das montanhas que a todos pertencem. Em meus sonhos também choro feliz com a aurora boreal de fundo, sem plangência, sozinho, mas sem egoísmo, em meu paraíso imaginário e sem-fim.

Depois desse sincero e copioso choro, em excelso anseio e com a sensação de leveza, receberei em meu espírito a divina inspiração para responder a quem ousar me perguntar: Por que ou por quem você chora?

UMA RESPOSTA VIRTUOSA

Choro porque sou humano e tenho sentimentos à flor da pele. Choro pelos brasileiros que creem nos pulhas que iludem os mais simples; pelos que têm o apoio dos escravos do fanatismo religioso, pelos iludidos à boa-fé, tudo com o malefício das leis mortas, ineficazes, ridicularmente incapazes de educar e/ou ressocializar. Choro, sobremaneira pelos condenados originários da miséria humana.

Meu mundo não é sombrio. Tampouco é cinzento. É colorido igual aos meus sonhos de outrora. Aliás, sempre tenho dito que ganho mais do que preciso e recebo mais do que mereço. Tenho poucos, mas leais amigos. Por isso e por muito mais não tenho vergonha de chorar.

CONCLUSÃO

Mas, afinal, chorar faz bem? “Certamente faz”, diz o psicólogo transpessoal Roberto Ziemer, de São Paulo. “Diversos problemas psicossomáticos e também episódios de depressão têm sua origem na repressão do choro. As lágrimas ajudam a pessoa não só a expressar suas necessidades, mas também a preenchê-las.” Chorar funciona como uma descarga física e emocional. O filósofo romano Sêneca havia escrito: “As lágrimas aliviam a alma”.

Um antigo provérbio hindu afirma que chorar faz bem para a aparência (obviamente depois que o inchaço dos olhos amenizar.). Talvez seja por isso que as pessoas usam óculos escuros nos velórios e enterros. Ou seja, chorar traz benefícios para o corpo, para a alma e para o humor. Parece um contrassenso, mas rir também traz inúmeros benefícios psicofísicos.

Entre rir e chorar você, conspícuo leitor, escolhe o que melhor lhe convém. Eu choro e rio, rio e choro até quando vejo os desenhos animados lembrando-me da infância pobre, voando em vislumbres tristes do sobranceiro instante ou faustosidade sossegada que ora vivencio.

De acordo com Tom Lutz (escritor americano, e crítico literário.), a maioria das pesquisas atuais sugere que, ao contrário do que se pensa, o pranto não acontece num momento de clímax emocional para desafogar a tensão. As lágrimas aparecem, na verdade, quando o organismo está se restabelecendo da profusão de emoções.

Vergonha é um sentimento de desconforto que alguém sente devido à exposição de suas particularidades, fraquezas, defeitos, etc, ou por ter cometido gafe, ato risível ou desabonador. Trata-se de uma reação pós-crise, de um mecanismo natural de cura.

“Um bom choro vale mais que doses de tranquilizantes”, diz Guillermo Ruben. Portanto, luz verde para as lágrimas. Da próxima vez que sentir emoções fortes, abra as comportas sem culpa. Chore a mais chorar sem sentir vergonha de ser humano.

RESUMO DA CONCLUSÃO

Mahatma Gandhi catalogava:

“Os sete pecados capitais responsáveis pelas injustiças sociais são: riqueza sem trabalho; prazeres sem escrúpulos; conhecimento sem sabedoria; comércio sem moral; política sem idealismo; religião sem sacrifício e ciência sem humanismo.”.

Ouso e apraz-me essa ousadia acrescentar às palavras do humanista Mahatma Gandhi mais um pecado inominável aos olhos da humanidade: Ter vergonha de chorar.