A espera

Ela se alonga, depois de tanto tempo curvada. Sente dores nas costas e deita o olhar na paisagem que se descortina á frente.

O terreno é grande, como tudo naqueles ermos. Uma aléia florida demarca o caminho que leva da casa ao portão. Ao longe, essa senda curva abruptamente e no horizonte só aparece a mata que circunda as terras dali.

O olhar vagueia entre a abundante florada da buganvília, o mato rasteiro, seco nesta época do ano e a terra socada do caminho, que levanta nuvens de poeira, a cada vento que passa.

Meses passaram-se desde que ele, tangendo uma boiada, se foi pras bandas do oeste.

Sabe que dessa venda virá o dinheiro pra o casamento tão esperado e sonha.

Na casa suas irmãs conversam enquanto trabalham, e ela fecha os olhos pra trancar seus pensamentos, pois parece-lhe que lhe podem ver os pensamentos e ouvir as surdas batidas do seu coração.

Ao fechar os olhos, voa, voa e vai ao encontro dele, assim como ao bordar, costurava no tecido os sonhos pra vidas deles. Cada ponto era um toque de amor, cada desenho concluído era um desejo acalentado; costurou sonhos e bordou projetos em meadas coloridas de fina linha de seda.

É uma longa espera e ela abre os olhos pra contemplar a grossa aliança no seu anelar direito.

Lembra-se de quando ele veio pedi-la e das juras trocadas e isso aquece sua alma e esquenta seus ossos. Sorri antecipando a alegria que terá ao revê-lo.

Retoma seu trabalho naquela colcha delicada que acalentará noites de amor. Um arrepio lhe percorre a espinha ao pensar nisso e lembrar os beijos apaixonados que trocaram na ânsia de compensar esta espera.

Ele virá, mas enquanto espera ela tece e tece. Lembra de algo que leu... seria Penélope o nome dela? Sente-se assim, mas alegra-se ao saber que das sereias ele anda longe e no seu caminho o mar bravio é uma longa estrada que leva ao mercado de gado. Espeta o dedo e espantada vê uma gota de sangue molhar o delicado linho da colcha. Assusta-se ao pensar imediatamente em gado no matadouro...

Que loucura, levanta rápida pra lavar as mãos e balança a cabeça pra afugentar aquela louca associação de idéias. Morte, sangue, não!

Sabe-se cansada e resolve ler um bom livro.

Muito longe dali, uma boiada imensa chega ao fim da jornada.