A VIAGEM

Os primeiros raios do astro rei bordam o céu, no pátio esguias silhuetas se deslocam freneticamente em meio aos enormes vagões previamente preparados para em alguns minutos saírem serpenteando pelos trilhos afora nos mais de trezentos quilômetros que separam as duas cidades.

O burburinho aumenta e um leve cheiro ocre já anuncia o pré-aquecimento das locomotivas.

As cargas já estão acomodadas nos vagões próprios e as bagagens também.

Passageiros se acotovelam e discutem sobre o conforto e a rapidez da viagem.

As damas, vestidas à caráter, fora da visão dos pais, acenam e gracejam com os rapazes e distribuem discretos e lindíssimos sorrisos...

Os funcionários convocam os passageiros para se acomodarem no vagão indicado na passagem.

Vergando o uniforme da empresa, com bem polidas chapas metálicas contidas nos bonés e nos blusões, os servidores de maneira gentil esperam na porta do vagão os passageiros.

Nesta hora o burburinho é quase ensurdecedor, mistura-se tudo: o ronco das locomotivas, os estridentes apitos, o riso de quem parte e o choro de saudade daqueles que ficam!

Chegou a hora, aumenta a pressão do gigante, que pouco a pouco se move, aumentando paulatinamente a velocidade até atingir a incrível marca de setenta e cinco quilômetros por hora. As árvores às margens da ferrovia parecem avançar em sentido contrário ao da desengonçada máquina. O cheiro ocre se espalha no ar e fagulhas de brasa riscam a escuridão da selva, o silêncio é literalmente quebrado por longos silvos do gigante de ferro. Os fiscais educadamente solicitam o tíquete da passagem para conferência e rubricam o bilhete.

No vilarejo parece festa, todos esperam o trem, que com seu resfolegar quebra a rotina da pequena vila cravada no seio da imensidão da floresta amazônica.

O silêncio da floresta é invadido pela barulhenta máquina que provoca assombro e faz tremer apavoradas aves, animais e até o próprio homem se bestifica com o gigantesco engenho que desliza chacoalhando seu enorme e pesado corpo conectado aos trilhos!

No interior da máquina homens e mulheres se confabulam... no restaurante muitos se deliciam com os quitutes oferecidos.

Aos poucos o sol se esconde por detrás da densa floresta; no céu pequenos pontos luminosos anunciam uma noite tranquila.

Os passageiros se acomodam nas poltronas, alguns mantêm conversação baixa com o vizinho, outros dormem profundamente.

Da floresta saem alguns animais encantados e atônitos com os brilhantes e encantadores olhos do perigoso monstro que os envolve com aquele misto de pavor e admiração e muitos são literalmente pulverizados por aquele poderosíssimo, pesado e desconhecido monstro.

No silêncio da madrugada chega-se ao final da viagem, apesar da fadiga, tudo transcorreu dentro do previsto. Claro, ocorreram pequenos incidentes, porém, não foram visíveis aos passageiros, apenas alguns dos tribulantes observaram...

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João Correia
Enviado por João Correia em 02/10/2012
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